Parece que na Suiça fez-se um referendo para se decidir se as férias deviam aumentar ou não duas semanas. Ou seja, os suíços passariam de quatro para seis semanas de férias. Como lição a outros países europeus, fica o resultado: um belo e redondinho «não». O pessoal da Suíça acha que se acrescentar mais duas semanas de férias ao tempo que já têm, haverá perda de competitividade e isso não pode acontecer porque, crêem eles, isso fará com que uma situação que funciona bem se deteriore. O receio é o de que aquele tempo extra de descanso venha a provocar mazelas na economia e que, com o tempo, seja responsável pela perda de postos de trabalho e do maravilhoso nível de vida que têm. Diziam algumas pessoas na reportagem que gostam dos seus trabalhos e dos seus patrões e que acham que um alargamento das férias iria prejudicá-los muito mais do que beneficiá-los.
Mais: há uns tempos tinham feito um referendo em lhes era perguntado se queriam que tivesse lugar uma diminuição de impostos. A resposta? Outro redondo «não». No fundo, o nível de vida invejável que têm não se mantém à custa de pó de fadas, mas de trabalho e de impostos. Parece-me que naquele país se vê o retorno do que se paga e, portanto, as pessoas vivem satisfeitas com a sua contribuição, uma vez que sabem onde é aplicado o dinheiro e usufruem dos benefícios que ele proporciona (por cá temos algumas dificuldades em perceber para onde ele vai, mas enfim...).
Fiquei deliciada a ouvir isto e quase com vontade de fazer as malas. Poderão dizer-me «ah e tal, eles só cantam de galo porque vivem bem, não é com estes ordenados de miséria que por aqui há, blá blá blá blá». Muito bem, têm razão. Contudo aqui não me interessam tanto os ordenados fantásticos quanto a mentalidade de que «uma mão lava a outra e as duas lavam o rosto». Vivem como vivem porque não se importam de trabalhar, porque sabem que precisam do patrão e que o patrão precisa deles e que, portanto, remam todos para o mesmo lado. Olham para os outros países (inclusivamente para o nosso) e vêem os disparates que vamos fazendo em prol de uma boa rambóia. Aprendem com a lição: duas semanas de férias a mais era muito bonito, sim, mas pode ser um presente envenenado capaz de minar uma economia que por enquanto vai vem e recomenda-se.
Não sou bruxa, mas arriscava-me a apostar que se por cá se fizesse um referendo semelhante, provavelmente passaríamos todos a ter mais duas semanas de férias. Os argumentos seriam os de que "não são duas semanas que matam uma empresa, o que a mata é o dinheiro que os gestores metem ao bolso" (esta já é tradição), que numa empresa "quem faz alguma coisa é o trabalhador que lá deixa muito suor por tuta e meia enquanto os outros não fazem nada e conduzem brutos carros e andam para aí de fatinho" (clássica, também), entre outros. Não esqueçamos que vivemos num país onde as pessoas se identificam com um boneco ridículo como o do «Zé Povinho» que, como dizia a Maria Filomena Mónica no outro dia, é a figura do trabalhador pobre que faz um gesto feio nas costas do patrão porque não tem coragem de o enfrentar pela frente. É verdade que vivemos mal, que temos salários baixos, que perdemos poder de compra, que estamos caídos em desgraça aos olhos de boa parte da população mundial, mas parece-me que o problema também está na forma como muitos pensam que têm todos os direitos do mundo por fazerem o mínimo possível. Ainda hoje, no autocarro, ouvia uma senhora berrar, para quem a quisesse ouvir, frases pouco simpáticas e desnecessárias sobre a patroa: «Eu é que não posso ir para uma esplanada apanhar sol que a minha patroa não deixa. Isso é que era bom! A patroa lá está à minha espera...». Claro que está: é patroa, manda e paga para isso. Enfim, é um problema ao nível do modo de pensar e está visto que teríamos muito para aprender com os belos dos helvécios. Para se chegar onde eles estão não é só preciso um Governo ajuizado: também é preciso esforço e trabalho. E se por cá é verdade que temos gente muitíssimo trabalhadora, não é menos verdade que temos também muitas pessoas que julgam que o dinheiro que recebem no final do mês se deve à beleza dos seus lindos olhos e nada mais.
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