quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Harry Potter: já cá canta, mas...

Já tenho há uns dias o novo livro Harry Potter e a Criança Amaldiçoada. Ao contrário do que aconteceu com os outros sete volumes da saga, este livro manteve-se dentro do saco no exacto sítio onde o pousei quando o trouxe para casa (até que o tirei para a foto). Estou, por agora, com pouca curiosidade para lê-lo, o que talvez não seja assim tão estranho.


Li o primeiro volume da colecção ainda antes de entrarmos no novo milénio, ainda antes de se tornar, também em Portugal, num enorme fenómeno. Li-o e tenho-o ainda na edição mais antiga:


Claro que o que aconteceu a seguir foi um fenómeno que só os outros fãs de Harry Potter conseguem compreender: uma corrida para comprar os próximos livros disponíveis, que naquela altura ainda eram poucos, pois a autora ainda estava a escrever a saga. A febre foi tanta que, tendo a FNAC apenas um volume disponível de A Câmara dos Segredos, comprei o que tinha, embora exibisse uma valente dobra na capa. Que se lixassem as mariquices com os livros: eu queria era saber como continuavam as aventuras de miúdos feiticeiros numa escola muito mais fixe do que a minha. E assim lá fui andando de livro em livro até chegar ao último. J. K. Rowling disse que não voltaria a escrever sobre Harry Potter e dedicou-se aos policiais e, por isso, perdi a esperança de voltar a ler sobre aquelas personagens que nos acompanharam durante tantos e tantos anos.

Agora saiu este livro e tenho o receio de que não esteja à altura. O que lhe precedeu foi tão bom, tão perfeito que agora temo o que daí venha. Também o facto de estar habituada a ler Harry Potter em texto narrativo faz-me agora desconfiar de uma continuação em texto dramático (que é, aliás, o guião da peça que efectivamente se fez com as personagens que tão bem conhecemos). Por outro lado, também tenho secretamente aquele desejo de prolongar a possibilidade de ler o livro. Ler um livro pela primeira vez é um luxo que, claro, só acontece uma vez com cada livro. Quando a história é boa, até há a vontade de andar para trás no tempo só para a lermos pela primeira vez novamente. Por isso, vou esperar que a vontade venha. Por agora ando ali às voltas com A Tia Tula, de Miguel de Unamuno, e com outro de que vos falarei depois e que é booooooooom. Mas depois...

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Aventuras num autocarro da Carris

Hoje precisei de apanhar um autocarro e senti-me de volta à aldeia da minha mãe, onde a carreira passa ao início do dia e só volta a levar as pessoas a casa à noite. Isto porque cheguei à paragem (estou a falar de Lisboa, meus caros, a capital do país) e faltavam uns fofos trinta e oito minutos para o autocarro passar. Note-se que nos horários da Carris, supostamente, ele devia passar de dezanove em dezanove minutos. Já mandei tantas reclamações à empresa que até fico enjoada de pensar em mandar mais uma. Estou bem farta de sentir que em Portugal o serviço de transportes públicos é absolutamente asqueroso. Se formos à capital do país vizinho podemos ver o que andamos a perder. Em Portugal gastam-se anos de vida com os transportes públicos! Em tempos julguei que a Carris até funcionava bem... Pois, em tempos. Foi até começar a acabar com certos autocarros e a espaçar cada vez mais a frequência dos mesmos, fora as vezes em que pelo meio dos horários falha um ou outro e os tempos de espera disparam para o dobro ou o triplo. Os passes e os bilhetes, esses, continuam ao mesmo preço. Portanto, paga-se o mesmo por uma coisa cuja qualidade só decresce.

Mas além da miséria que se passa com os transportes públicos (e que dava direito a uma série de quixotadas), ainda temos o comportamento dos seu utilizadores, que é frequentemente pavoroso. Medonho mesmo! Portanto, cheguei à paragem, esperei mais de quarenta minutos pelo autocarro, vi muita gente chegar e partir noutros autocarros que não o meu e quando este finalmente chegou, duas ou três pessoas passam-me à frente e entram, como se tivessem chegado primeiro. Outra vez: já reclamei tanto que já nem me apetece mais. Se querem ser uns merdas, sejam uns merdas. Os meus pais deram-me educação, mas parece que houve outros que devem ter andado a coçar a micose em vez de ensinar algum civismo aos filhos.

Não contente com isto tudo, ainda sou brindada com uma cena digna de um Óscar. Portanto, o autocarro chega com atraso, certo? Estamos em Lisboa, apanhamos todos os sinais vermelhos que há para apanhar e, assim, avançamos vagarosamente rumo a um destino que já me parece utópico. Como isto ainda era pouco, em determinado momento entra no autocarro uma senhora ainda jovem que devia ter um problema numa perna. Um rapaz que ia sentado com a sua esposa naqueles lugares reservados que todos conhecemos levanta-se para ajudar a senhora a entrar e a sentar-se. Ajuda-a e vai conduzi-la aos lugares reservados. Faz sentido, certo? Ela estava visivelmente mal e, portanto, faz mesmo sentido que se sente ali. Pacientemente, o motorista mantém-se parado na paragem à espera que a senhora, ajudada pelo rapaz, se sente e não caia com nenhum solavanco do autocarro. Mas o que resolve a santa mulher? Resolve que quer antes sentar-se no lugar sozinho imediatamente atrás do motorista. Exactamente: aquele que fica sobre uma roda e que portanto tem um degrau enorme. O rapaz bem lhe deu a mão, bem tentou fazer força no braço para que ela conseguisse subir para onde queria, mas ela mal conseguia levantar a perna. Houve um momento em que ainda pensei que o moço fosse fazer um degrauzinho com as mãos para ela se enfiar lá para cima. Felizmente, o motorista, que assistia àquilo com um misto de incredulidade e incompreensão, depois de ter o autocarro parado há alguns minutos, diz:

- Mas por que é que não se senta num lugar mais baixo???? 

Lá se fez luz naquela cabeça e o rapaz conduziu, então, a senhora até aos reservados. Ajuda-a a sentar-se e torna ele próprio a sentar-se ao lado da esposa. Parecia tudo acabado, mas mal as nalgas dele tocam no lugar, a senhora com o problema na perna vira-se para ele e diz:

- Quero ir para aí porque não gosto de ir de costas.

E lá se levanta o moço, ajuda a senhora a levantar-se, depois a sentar-se e vai ele mesmo sentar-se em frente à esposa. Finalmente o autocarro avança.

Há uma frase que digo muito e que é “Bondade a mais é burrice”. Cada vez que me confronto com coisas do género ou piores ainda é só dessa frase que me recordo. Se ninguém a ajudasse, estaríamos numa sociedade horrível. A senhora foi ajudada até à exaustão pelo rapaz e pelo motorista. Nunca disse “obrigada”, não tentou sequer agradecer e quando pediu para se sentar no lugar do rapaz fê-lo com rispidez. Está bem que eram lugares reservados, mas não havia mais ninguém de pé a precisar deles e acho que ficou bem claro que em caso de necessidade aquele casal cederia, com todo o gosto, o lugar. Mas julgo que nem mesmo o facto de serem lugares reservados dão direito àquela senhora, que já tinha parado um autocarro devido ao seu capricho de escolher sentar-se no lugar mais inacessível para ela, de falar assim com ninguém. Os lugares são reservados, mas que eu saiba não há nenhum asterisco que diga “E devem satisfazer-se os gostos relativamente a viajar de frente ou de costas.”. Não há asterisco, mas há uma coisa chamada “abuso” e outras que designamos por falta de educação e falta de civismo. Nos transportes públicos (mas também no trânsito em geral) isso abunda, começando pela empresa que desrespeita sistematicamente os seus horários e acabando no cidadão que não sabe que não andamos cá todos só para servi-lo.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Quando a realidade supera a ficção

Estou a ver o noticiário da SIC e antes do intervalo passou uma notícia que parece ter saído directamente de um romance, de tal forma é complexa e supreendente. E passa-se em Portugal. Ora vejam:

Um homem foi ao médico e, após alguns exames descobre que sofre de infertilidade crónica. O problema maior do que não poder ter filhos no futuro: é que já tem uma filha de dezasseis anos. Todavia, recordem-se, o médico informou o homem de que o seu problema não é de agora. Naquilo que eu imagino ser um pesadelo, o homem sujeita-se e à sua filha a testes de ADN que determinam que há noventa e nove porcento de hipóteses de ele não ser o pai da menina.

Não consigo sequer imaginar o que aquele homem está a sentir, mas talvez esse sentimento ajude a explicar o que se seguiu: estando já separado há algum tempo da mãe da criança, exige em tribunal à ex-mulher a devolução do valor da pensão de alimentos já paga; exige, pelo que compreendi, uma indemnização e que o seu apelido seja retirado do nome da rapariga que, note-se, até agora foi sua filha. Como à luz da nossa lei essa coisa monstruosa do “filho de pai incógnito” não é permitida, agora cabe à justiça investigar de forma a descobrir quem é, de facto, o progenitor da adolescente em causa.

Ora... Que dizer disto? Acho que estou de boca aberta desde que ouvi a notícia. Por um lado, não imagino o que possa este homem estar a sentir. Francamente, lemos tantos livros e tantas histórias com coisas parecidas e que nos soam tão distantes do que é verdade que nem por isso estamos preparados para quando a realidade se aproxima da ficção. Mas depois não pude deixar de pensar no que é, aos dezasseis anos, descobrir-se que o nosso pai não é mesmo o nosso pai; que a nossa mãe (caso soubesse que aquele não era mesmo o pai da sua filha, o que não sei se sucedia ou não) pode ter criado uma mentira de todo o tamanho; que aquele que conhecemos por pai está tão magoado que até o nome dele quer retirar a quem, convenhamos, é a última pessoa a ter responsabilidade nesta história. Acho que todos nos lembramos do que é ter dezasseis anos. Agora imaginem o que é ter essa idade e passar inesperadamente pela surreal história que relatei. A rapariga descobriu que o pai que sempre conheceu não é o verdadeiro pai biológico; pode ou não (pois, como disse, não sei o que aconteceu para que esta história decorresse assim) chegar à conclusão que a mãe tem muito para contar-lhe; pode vir a perder o nome que tem há dezasseis anos e ainda vai ter de passar pela experiência de uma investigação para se apurar quem é, então, o seu verdadeiro pai biológico (e ganhar um novo apelido). Além de tudo e como se fosse pouco, ainda assiste a notícias sobre isto na televisão e caso os que com ela convivem fiquem a saber da situação, ainda terá de conviver com as perguntas, os comentários e os olhares (não sejamos hipócritas: somos todos muito modernos, mas ainda adoramos uma boa cusquice). Não consigo imaginar pior. 

Espero que esta menina consiga ultrapassar isto da melhor forma. E que aquele pai que o foi, mas que já não é (e que, alegadamente, não quer mesmo sê-lo, já que nem o seu apelido quer que a rapariga mantenha) consiga também superar a dor de um engano, mais a raiva, a frustração e a tristeza que tudo isto deve trazer. Espero que esta história surreal tenha o final de quase todas as novelas e acabe bem.

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

A vida privada

Eu sempre procurei explicar aos meus alunos, desde o básico até ao secundário, que os livros têm de ser lidos para que saibamos bem de que tratam eles. Mas isto é problema velho como o tempo: no fim há sempre um bom punhado de garotos que opta por ir à internet procurar uns resumos e eu acabo invariavelmente a perceber que foram todos beber à mesma fonte e que poucos foram, realmente, ao livro. 

Que miúdos da escola falem de livros sem os terem lido é coisa que me chateia, agora que o ex-Primeiro Ministro tenha aceitado (sim, está certo assim, ninguém precisa de vir dizer que “é ‘tenha aceite’ que se diz”) apresentar um livro sem o ler atentamente primeiro é no mínimo embaraçoso. E que esse mesmo senhor, quando já confrontado com o vergonhoso conteúdo do livro, venha dizer que não volta com a sua palavra atrás é de doidos! Mas ainda mais de doidos é que depois acabe por decidir esquivar-se à tal apresentação porque leu o livro e percebeu que havia um filtro que não havia sido utilizado e que não, não houve pressões do partido para fugir à apresentação...

Eu julgava que as pessoas liam os livros antes das apresentações e, sobretudo, antes de aceitarem apresentá-los. Afinal parece que não. Aqui o azar grande foi que o conteúdo do livro é embaraçoso e ofensivo para muita gente. E o nosso ex-PM fica associado a esse pouco digno pedaço de papel, mesmo tendo decidido abdicar da apresentação depois da polémica estalar. 

Agora sobre o livro de que tanto se tem falado. Pelo que percebi do que fui lendo e ouvindo, o que ali está é de pouco proveito. O meu receio é que tanto alarido em torno do livro, juntamente com o cancelamento da apresentação, leve a que a curiosidade fale mais alto e que as pessoas corram a comprá-lo. Lembram-se do fenómeno Eu, Carolina? Pois, o meu receio é o de que se gere algo semelhante. Assisti ao programa “Eixo do Mal” da semana passada e, segundo o que foi dito, ainda que a montanha pareça ter parido um rato, isto é, ainda que o conteúdo não seja tão pornográfico quanto se possa à primeira pensar, não deixa de abordar algo que é da esfera privada. Se algumas ou todas as pessoas referidas no livro revelaram aqueles pormenores ao seu autor, o bom senso e a amizade que os terá unido deveriam imperar e nada daquilo deveria ser revelado. Mais grave ainda é o facto de se falar da vida privada de pessoas já falecidas. Ninguém virá novamente à vida para se defender disto ou daquilo e, portanto, aquilo que se diz sobre ela ficará para muitos como verdade porque não há outra versão com que a confrontar. Isso é terrível. Se há coisa que julgo dever ser respeitada é a memória. Quando a pessoa que morre é um grande vulto histórico e o facto que sobre ela se apresenta, por mau que seja, é também parte da História, então não há muito a fazer. Contudo, estamos, com este livro, a falar da vida sexual de pessoas que, ainda que sejam importantes na nossa vida política, não são com certeza vultos históricos e, ainda que fossem, em que é que a sua vida sexual nos pode interessar?

Já conheço dois casos de pessoas que procuraram o livro precisamente devido à polémica. Ou seja, o autor já ganhou uns trocos com toda a confusão gerada em torno desta aparente invasão de uma esfera privada que, para mim, devia ser intocável. Lamento que assim seja. Pela minha parte, acho que devíamos pôr-nos no lugar dos visados e imaginar o que seria invadirem de tal forma a nossa privacidade, deitarem ao mundo os nossos segredos, talvez partilhados no seio de uma amizade e agora atirados à ventoinha para que se espalhem por aí em forma de livro que dará lucro. Não o lerei e muito menos o comprarei. Não vou apresentar o livro, pelo que não preciso de lê-lo. E quanto ao que ele contém, acho que já foi falado até à exaustão. Neste caso, contrariarei a ideia de que é preciso ler um livro para saber do que trata. Recuso-me a entrar nesta brincadeira de espiolhar a vida privada. Quando o quiser fazer, faço-o com aqueles que aceitam que se lhes espreite o que não devia ser público e assisto à "Casa dos Segredos". Sempre é um mal menor, comparado com o outro, ainda que pouco recomendável também...

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Pede-se um favor

Um professor é um professor e mesmo sem ter turmas este ano e gostando de experimentar outros rumos profissionais, o ensino não deixa de nos estar no sangue. É por isso que decidi dar explicações de Português, do 1.º ao 12.º ano. Para isso, e entre outras coisas, criei uma página no Facebook e peço-vos que vão lá espreitá-la, que coloquem o vosso “gosto” e que a partilhem. O ano lectivo ainda começou há pouquíssimo tempo, mas quanto mais cedo, melhor. Podem chegar à página clicando aqui.

Agradeço-vos, desde já, estimados quixoteiros


domingo, 18 de setembro de 2016

Os lambe-botas

A propósito daquilo que desrespeito totalmente, daquilo que abomino, daquilo que vejo mais do que gostaria e a que preferi virar as costas antes de também eu me tornar, molemente, como a água:

“Por mais que me esforce não consigo compreender como há bichos humanos que só se comprazem em lidar com animais de músculos de cera e colunas vertebrais de arame, sem personalidade, sem cor, sem reacções - apenas lambe-botas com a alma cheia de ecos dos nossos sins. Qualquer coisa de semelhante à água que se adapta molemente a todos os feitios e mesmo quando endurece, quando gela, ainda conserva a forma da última vasilha.”

Excerto do conto “Insónia”, in O Mundo dos Outros, de José Gomes Ferreira 

"A razão da sem-razão que à minha razão se faz, de tal maneira a minha razão enfraquece, que com razão me queixo..."

Andei a mexer nas definições da página do Facebook relativa ao blogue Moinho de Vento - Livros Usados. Perante uma possibilidade que não estava a compreender, pedi mais explicações. Se observarem a resposta, podem ver quão esclarecedora ela é. Até a sublinhei para verem melhor.


Ah, o enorme título desta quixotada remete para um excerto do livro Dom Quixote de la Mancha (primeira parte), quando D. Quixote medita sobre livros de cavalaria e sobre as coisas fantásticas que por lá estão escritas, algumas tão indiscerníveis como esta.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

A Família Forsyte I - O Balanço


Esta saga de John Galsworthy está esgotada, mas encontra-se facilmente em alfarrabistas (está à venda na Ulmeiro, em Benfica, por exemplo). A Família Forsyte é composta por três volumes e depois há mais três com o título Os Novos Forsyte. O autor, John Galsworthy, venceu o prémio Nobel da Literatura em 1932, distinção para a qual a saga desta família contribuiu bastante.

Só ainda li o primeiro volume. Todavia, por vezes, ler o primeiro volume chega para perceber que aquilo não é para mim e desistir. Isso não vai acontecer neste caso e vou continuar a leitura desta saga (ainda que não pretenda ler os três livros de uma assentada). Como o próprio título indica, quem protagoniza esta obra é uma família de classe alta em Inglaterra, uma família muito apegada à propriedade, à posse de coisas. Um dos protagonistas deste primeiro volume, subintitulado “O Proprietário”, é Soames Forsyte, um dos membros desta família e alguém que leva a ideia de propriedade tão a sério que faz da própria esposa uma possessão sua. O que o une a ela não é propriamente amor, é mais a ideia de ser ele quem a tem, ser ele quem a pode exibir e causar inveja através dela. Em torno desta personagem gerar-se-á um conflito que fará avançar a acção e o desenrolar deste mesmo conflito vai mostrar-nos o carácter dos diferentes membros desta enorme família (tão grande que a edição fornece uma árvore genealógica). O narrador subjectivo e omnisciente é extremamente irónico e aproveita até as mais pequenas acções do dia-a-dia para mostrar ao leitor como são estes Forsyte. A forma como lidam uns com os outros, como tratam os animais, a importância que dão às coisas em deterimento das pessoas, a preocupação com as aparências e com o que os outros possam pensar, o modo como sistematicamente atribuem preços às coisas e como só depois de o fazerem conseguem perceber se elas valem a pena ou não, a própria rivalidade entre os membros da família são aspectos narrados com grande ironia e ajudam o leitor a perceber que há dois tipos de pessoas no mundo: os Forsyte e os outros. Aliás, é mesmo isso que o narrador pretende: mostrar que este tipo de pessoas são algo à parte, alguma coisa de diferente, referindo sempre quais são as características que fazem destes homens e mulheres Forsyte uma categoria diferente dentro do conjunto das pessoas. Ora, quando isto sucede num livro, a melhor forma de mostrar a diferença é pelo contraste com personagens que não são como eles. Algumas personagens em particular, que não são originalmente Forsyte, acabam por fazer sobressair o que de mais mesquinho existe naquela família de classe alta.

A julgar pelo primeiro volume, a história promete e a saga vale mesmo a pena. Seria bom que a Livros do Brasil, que agora ganhou novo fôlego, reeditasse esta obra. Bem sei que é uma empreitada imensa, mas vale a pena porque para quem gosta de histórias familiares em que, mais do que um indivíduo, importa a família como um todo e a sua capacidade de agir em uníssono, procurando fugir a tudo o que descomponha a sua harmonia, esta saga é o ideal.

Nota: A imagem da capa saiu da página da Wook, ainda que esta saga se encontre esgotada.

A importância das lombadas

Acho que já falei do Kindle umas duas ou três vezes neste blogue. Para quem não lê, o Kindle (ou outro e-reader é mais ou menos o mesmo que apanhar a azeitona, ou seja, não fazem ideia do que seja), mas para quem gosta de ler, isto dos ebooks dá que pensar e gera geralmente uma espécie de batalha: livros em papel versus livros digitais.

Já dei a minha opinião sobre isto tudo e não vou massacrar-vos com ela novamente. Convivo perfeitamente com os livros em papel e com os outros. Não vejo aquele anunciado fim dos livros tradicionais, acho que não acontecerá mesmo e não tem de acontecer. Podemos ter o melhor dos dois mundos. Admito que prefiro os livros em papel porque acho que a concentração na leitura é consideravelmente maior, mas não deixo de ler no Kindle. Principalmente quando tenho acesso a livros que não se encontram disponíveis nas livrarias ou quando se trata de histórias que gostaria de conhecer, mas não tanto que desejasse gastar muito dinheiro nesses livros.

Agora, além da questão da concentração na leitura, os e-readers têm um defeito que com os livros em papel não costuma verificar-se: no Kindle eu não vejo lombadas e estas, parecendo que não, são muito importantes. Quando preciso de escolher um livro em papel dos muitos que povoam as estantes cá de casa, olho para as lombadas. Percorro as prateleiras com o olhar, vou vendo os títulos, os autores e tenho uma visão bastante completa da minha biblioteca. Com o Kindle isso não acontece. Tenho-o organizado por colecções: Literatura Portuguesa, Literatura Estrangeira em Português, Fantasia, Biografias, por aí fora. Mas o chato é que quando entro numa colecção só vejo títulos. Passo as páginas e são títulos e títulos. Sinto-me assoberbada com palavras, pois ao chegar às últimas páginas da colecção já não me lembro dos títulos que vi inicialmente. Não há uma visão de conjunto, a mesma que se tem quando paramos a olhar para as estantes físicas e conseguimos abarcar com o olhar as muitas possibilidades de escolha. Por isso, escolher o próximo livro a ler no Kindle pode ser tarefa infernal, sendo bem mais fácil numa biblioteca de livros em formato tradicional. Mais: se quiser saber do que trata um destes últimos livros, basta puxá-lo um pouco para fora da estante e leio a sinopse. No caso do ebook tenho de o abrir, ir até à posição onde há uma sinopse (se é que há sinopse) e depois decidir se prossigo com a leitura ou se encerro o livro. Repetir esta tarefa para vários livros cansa.

Ainda assim, mesmo sem lombadas, o Kindle é fabuloso pelas possibilidades que permite. Este ano, pela primeira vez, fui de férias sem um livro em papel. Para Madrid levei apenas o Kindle e foi lá que acabei de ler o Hombres Buenos, do Reverte e que comecei As Reinações de Narizinho. A bateria durou o tempo todo, nunca precisou de ser carregado, e como o ecrã é iluminado, nem precisava de luz acesa à noite, pelo que o moço podia dormir sem eu o perturbar muito. Portanto, como em tudo na vida, os e-readers têm coisas boas e coisas menos boas. O ideal é vivermos ambas as experiências: as que nos proporcionam os livros em papel e as que os outros nos proporcionam. 

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Gratificante

Os emails que recebo de antigos alunos a quem poderia estar a dar aulas este ano e de outros que mudaram de escola, mas que não querem perder o contacto comigo são a prova de que tomei a melhor das decisões. Os carinhosos elogios ao meu trabalho mostram-me que eu não podia pertencer ali. O que importa fica comigo: os adolescentes que querem manter o contacto com uma professora entre tantas que já lhes cruzaram a vida. O resto é para o esquecimento que tem de ir.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Chora, Camões, chora... II

O ataque de hoje a Camões é um ataque que acontece na escrita porque foneticamente as duas “palavras" soam da mesma forma. Não é nada raro (nada raro mesmo) encontrar páginas ou placas onde está escrito algo como “Seja benvindo”. É sempre bom ser bem recebido em algum lugar, mas é ainda melhor quando o somos sem erros ortográficos. É que “benvindo” é, quando muito, coisa parecida com um nome próprio que algumas senhoras têm: é o caso de quem se chama “Benvinda”. Na verdade, quando queremos receber bem alguém escrevemos “bem-vindo”. Não é difícil de recordar se se lembrarem do que a palavra significa. Eu sei que a tendência de queda do hífen é uma coisa capaz de partir a cabeça a qualquer alma, por paciente que seja, mas há casos em que o hífen se mantém. “Bem-vindo” é um composto morfossintático, isto é, é uma palavra que nasce da junção de duas palavras diferentes.

Se conhecerem alguém que desconheça a ortografia da palavra que usamos para receber bem alguém, ofereçam-lhe esta quixotada. Serão sempre “bem-vindos” aos meus domínios.

Vem aí o outono!

Meus caros, vem aí o outono! E agora vocês dizem em coro “Pois claro que vem: estamos quase a meio de Setembro!”. E eis que eu respondo que não é por isso que o digo. E gritam os meus queridos quixoteiros: “Pois claro que vem: o céu está meio esquisito e já precisamos de um casaquinho ao final do dia.”. E eu digo que não, não é por isso que vos anuncio com tanta certeza a proximidade do Outono.

É só porque hoje já vi um cão de camisola. 

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Decisões

Camões dizia “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades / Muda-se o ser, muda-se a confiança:”. De facto, tudo muda e isso implica que, em determinados momentos, decisões têm de ser tomadas, ainda que provoquem dores de cabeça e ansiedade sem fim.

Andei muitos dias sem contar-vos isto porque primeiramente tive de habituar-me eu à ideia. Acho que agora já o consigo fazer: depois de vários anos a trabalhar no mesmo sítio, a leccionar Português a tantos meninos e meninas que vi crescer aula após aula, decidi deixar o colégio. Estou, agora, à procura de trabalho, não necessariamente na área do ensino, mas estou à procura de uma oportunidade que me faça feliz.

Decidi sair porque considero que quando alguma coisa está de facto a fazer-nos mal, devemos deixá-la para trás e seguir em frente. Decidi assim, também, porque tenho o apoio dos meus que, dia após dia, assistiam a um cansaço acumulado, a um desanimo que só crescia, a uma tristeza que só podia desaparecer fugindo do que me fazia mal. Decidi desta forma porque acho que a nossa ética profissional e os nossos valores devem estar acima dos euros que nos pagam no final do mês. Ser professor não é fácil, mas ser professor em algumas instituições é ainda pior.

Aliás, depois de seis anos enquanto professora, tenho de dizer-vos que é uma profissão lindíssima, que nos enche de orgulho. Mas é, talvez, a profissão mais ingrata que conheço. Toda a gente é “professor de bancada”, toda a gente tem uma correcção a fazer à metodologia de um professor, toda a gente acha que o professor pode sempre dar mais um apoio, fazer mais um teste diferenciado, mesmo que já não lhe sobre tempo para nada, nem para dormir. E no fim, toda a gente acha que os professores são muitíssimo bem pagos para o que fazem, sendo que essa "toda a gente" não faz a menor ideia da quantidade de trabalho que o professor tem diariamente. Porém, também há lugares em que a própria instituição facilita a vida ao professor. E há outras em que quase parece que o professor é um preguiçoso que não quer fazer nada e que tem de ser posto a trabalhar (mesmo que seja em actividades que nada tenham que ver com a sua formação) seja como for.

Mas agora não é disso que falo. Partilho convosco este meu novo estado: o de desempregada. Não estou completamente feliz porque claro que quero trabalhar, mas estou certamente mais feliz do que estaria se continuasse onde estava. Diariamente procuro oportunidades e sei que acabará por aparecer qualquer coisa. Até lá vou dar explicações de Português (se conhecerem miúdos da zona de Lisboa, do segundo ciclo ao ensino secundário que precisem de explicações, de preparação para exames e provas de aferição, lembrem-se de mim e sugiram-me), até para não deixar completamente de lado o ensino que é coisa que está bem em mim. Todavia vou procurar outra vida, sobretudo ligada aos livros que é o que mais me faz feliz. 

Camões também disse, no mesmo poema, que “Continuamente vemos novidades, / Diferentes em tudo da esperança: / Do mal ficam as mágoas na lembrança, / E do bem (se algum houve) as saudades.”. Destes anos todos fica de tudo um pouco. E quando a balança fez descer mais o prato das mágoas do que o do bem, o caminho era só um. Mas como, de facto, tudo muda, também não haverei de parar assim tanto tempo. Outra mudança virá.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Chora, Camões, chora... I

Existem dois tipos de portugueses: os que consideram tudo uma “perda de tempo” e os que acham que é uma “perca de tempo”.

Amigos, a derivação não afixal é um processo de formação de palavras que consiste na transformação de um verbo num nome através da queda da desinência verbal e da inserção de uma terminação nominal. Assim, por exemplo, “vender” passa a “venda”; “cortar” transforma-se em “corte” e “perder” passa a “perda”.

Deste modo, como raio pode haver quem ache que “perca” é um nome derivado de “perder”??? “Perca”, senhores que nomeiam peixes a toda a hora, é o Presente do Conjuntivo do verbo “perder” na primeira e na terceira pessoas do singular. Ah, e como referi, é um peixe... Mas não me parece que seja bem do peixe que queiram falar.

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Aos gritos

A minha vizinha de baixo está agora a mandar beijinhos a alguém e a desejar-lhe "tudo de bom". E como é que eu sei? Sei porque a senhora ouve mal e portanto fala de maneira a ser ouvida num raio de quatro quilómetros e meio. Chega a ser paradoxal, não é? Bom, note-se que faltam quinze minutos para a uma da manhã e que ela já estava nisto às onze. Note-se ainda que ela é uma pessoa que fala das coisas com grande fervor e, geralmente, com muita indignação, o que, aliado ao tom de voz, roça a tortura para o resto do prédio.

Da casa desta senhora chega-me pela manhã a tipa que lê cartas na SIC, o berro que a Júlia Pinheiro dá ao iniciar o programa, o som do seu telemóvel a tocar (e olhem que a senhora parece o call-center da NOS quando falha o serviço), os decibéis com que fala ao telefone. É desesperante. Vou, por isso, aproveitar agora que não tem mais ninguém que lhe ligue a esta hora e vou dormir. Esta senhora dá cabo de mim!

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Precisa-se de código CAE

Hoje descobri uma nova profissão possível: comentador de notícias na internet. Já toda a gente sabe que comentar notícias que nos aparecem no feed do Facebook não é para todos. Convém ter um repertório de palavrões bastante desenvolvido; uma irritabilidade bem à flor da pele; a capacidade de criar insultos novos apenas pela junção de palavras que de modo isolado até são inócuas, mas que unidas a outras se transformam em verdadeiros calhaus metafóricos (incluir a palavra “mãe” nunca falha); uma total falta de domínio da interpretação textual; uma coragem excepcional apenas se se tratarem de comentários pela internet e fora de qualquer contacto visual; uma revolta interior para com o mundo e para com as pessoas, aliada geralmente à percepção de que a própria vida é uma porra e a dos outros é excelente. Quando todas estas características se juntam, nasce um comentador de notícias e o mundo fica mais rico.

Hoje apareceu-me na cronologia do Facebook uma notícia da Visão. Li-a atentamente e, chegando ao final da página, pude ver os comentários deixados a tal texto. O primeiro era nitidamente de uma amadora nisto de comentar notícias: era educada, o que dizia fazia sentido e não escrevia como um troll. Resultado: fiquei desapontada. Pensei que ler comentários a notícias já não era tão emocionante como antes e preparei-me para regressar ao Facebook. Mas, nesse momento, num lampejo de sorte, os meus olhos desceram um pouco, olharam para o fundo da página e depararam-se com um comentário ao primeiro comentário que era bom, muito bom.

Este é um blogue familiar e portanto vai reprimir a vontade de reproduzir o comentário. Mas pode tentar parafraseá-lo. Ora, se o primeiro era, como dizia, educado, adequado ao conteúdo da notícia, bem escrito e ponderado, esta primeira resposta dizia qualquer coisa como “E se fosses fazer um movimento de sucção ao órgão genital do teu progenitor? Os indivíduos que se dedicam à res publica são todos idênticos entre si.” (note-se que a notícia nada tinha que ver com política...). Tudo isto escrito como se todo o analfabetismo do mundo se concentrasse num só ser e saísse do teclado do computador numa explosão de erros ortográficos, sintáticos, morfológicos e lexicais, semelhante a uma orgia entre os capítulos da gramática. Uma pérola, portanto.

Ora, eu, criatura preocupada com o mundo e com a evolução da sociedade, dei por mim a pensar que chegar a este ponto de ordinarice, desadequação e imbecilidade não é para todos. Exige anos e anos de apuramento. No fundo, exige selecção natural. Quantos comentadores wannabe ficaram pelo caminho por serem incapazes de mais do que um “A tua progenitora!” ou um “Vai tomar no orifício por onde são expelidas as fezes!” (que, realmente, é muito fraquinho)? Quantos?! São vidas desfeitas, senhores. Mas felizmente há os outros: os que ligam os computadores de manhã, correm para os jornais e as revistas, procuram notícias para comentar ou comentários aos quais responder, trabalham arduamente para mostrar o que de mais belo existe no mundo online: a liberdade para insultar o próximo gratuitamente, sem qualquer razão, e com erros. É lindo e quase me faz chorar.

Por isso, penso escrever amanhã uma carta ao Ministro das Finanças onde expresse a necessidade imperiosa de se criar um código CAE para esta nobre profissão que vem despontanto há alguns anos na internet, mas que ainda não foi devidamente considerada. Ser comentador de notícias deve ser motivo de orgulho, pois exige esforço. Juntar palavrões de modo a gerar um insulto inimaginável (e por vezes estranho do ponto de vista anatómico e ético) a alguém que não conhecemos e não nos fez mal nenhum é de génio e é capacidade que leva anos a ser apurada. Conseguir desviar totalmente do tema da notícia e fazer um comentário que deixe o leitor a pensar no que raio tem uma coisa que ver com outra é só para profissionais! Mas o mais difícil é ser capaz de fazer um comentário tão poderoso que o leitor vai lembrar-se mais facilmente dele do que da notícia (que foi o que me aconteceu hoje). Por favor, senhores das Finanças, dêem um estatuto profissional a esta gente porque o que eles fazem é do "órgão sexual masculino em calão”!

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Auto-ajuda e os danos colaterais

Alberto Montt no seu melhor. Ora aí está uma boa maneira de encarar os livros de auto-ajuda (ou outros que, não assumindo esse rótulo, acabam por não passar de mais do mesmo).

Nota: A imagem saiu desta página, do blogue do autor

domingo, 4 de setembro de 2016

Vinte anos depois

Lembram-se do "Sai de Baixo"? A Globo está a repetir episódios e apanhei há pouco um bocadinho de um. Nele, a personagem Vavá perguntava se ao menos daí a vinte anos conseguiria organizar uma festa de Natal como devia ser. O momento seguinte era uma prolepse que mostrava as personagens vinte anos depois, mais precisamente em 2016! Achei piada à coincidência, mais concretamente ao facto de estarem a preparar viagens por Plutão e por Vénus, de estarem vestidos como os Jetsons...

Não, Vavá, daí a vinte anos ainda não teremos esse aspecto meio robótico e não andaremos a passear alegremente pelos outros planetas do sistema solar. Vamos mesmo estar mais parecidos com o que éramos em 1996 do que com aquele futuro tão extravagante que podiam imaginar. Ou então também não: não vamos para outros planetas, mas falamos com a outra ponta do nosso próprio planeta com a maior das facilidades. Pensando bem, até que mudaram umas coisas. Ah, e matámos as calças à boca de sino. Yeeey!

Unir pelos livros

Não fui à Feira do Livro no Palácio de Belém, mas pareceu-me uma excelente ideia. Aliás, até acho que deveria durar mais tempo ou repetir-se mais vezes ao longo do ano. Iniciativas que promovam a leitura, que agitem o mercado livreiro, que levem as pessoas a querer ter livros e conhecer novos títulos parecem-me sempre dignas de admiração e apenas pecam por serem poucas.

Todos sabemos bem como param as modas por agora. Grandes grupos editoriais, poucas editoras independentes por um lado e no que respeita à edição de livros; por outro, grandes cadeias de lojas que vendem livros (já para não falar dos sítios improváveis que também os vendem, como hipermercados e estações de serviço) e que fizeram sombra e acabaram por ajudar a matar as pequenas livrarias que por aí existiam, enchendo de cor as nossas cidades. Esta é a realidade. Ora, uma vez por ano em Lisboa e no Porto surge a Feira do Livro, onde as editoras se juntam numa festa na qual o livro é rei. É bom, mas sempre me pareceu que uma vez por ano não chega. Queixamo-nos tanto de que a população não lê, de que crianças e jovens fogem dos livros como o Diabo da cruz, mas não são assim tantas as iniciativas que levem tantas pessoas até eles. É verdade que existem alfarrabistas, feirinhas em estações do metropolitano, feiras do livro antigo... mas nada que seja tão apelativo quanto a Feira do Livro. Aliás, do que vou sabendo, às vendas de livros usados só vão os que têm uma relação já sólida com os livros. Quem prefere bestsellers ou outras novidades não tende a atravessar a cidade para ir a esses pequenos eventos. 

Por isso esta ideia da Feira do Livro no Palácio de Belém faz sentido. Gostaria que as editoras, pelo menos a mais pequenas que não fazem parte de grandes grupos editoriais, pudessem juntar-se mais vezes e trazer os livros até às pessoas (já que estas não os procuram tanto como gostaríamos). Gostaria que existissem mais iniciativas em que o livro fosse o objecto central. Mesmo que depois haja gelados para comer, refrigerantes para beber ou outras actividades que se enquadrem, gostava que os livros nos unissem mais, pois é para isso que existem. Se ler sempre foi um caminho para ligar pessoas, comprar livros também poderia ser. Ajudaria os leitores e o negócio livreiro. Só tínhamos a ganhar.

Bad movies

Sim, isto existe. Passou no canal Syfy.


sábado, 3 de setembro de 2016

Gatos e ratos

O meu moço leva muito a sério a ideia de que os ratos são brinquedos para gatos.


Sem devolução

Na viagenzinha matinal pelo Facebook, deparei-me com esta notícia da revista Visão.

Infelizmente, já todos sabemos que há pessoas que vêem nos animais um acessório que ajuda a compor o outfit. Enfim, há quem use pulseiras, carteiras, sapatos e há quem use animais. Sobre estas pessoas tenho apenas duas palavras a dizer: são estúpidas.

Ler este artigo da Visão é doloroso. Que raio de pessoas são estas que arranjam animais porque determinada raça está na moda e porque este ou aquele famoso também tem um e depois acabam por ver-se livres deles quando chegam à idade em que começam a adoecer e a precisar de mais cuidados? E que raio de besta devolve um cão porque não combina com o sofá? O cão é que devia poder devolver o humano que lhe calhou na rifa porque gente assim não merece um animal.

Cães, gatos ou outros bichos não são simples moda. São amigos que arranjamos para o tempo que durar a vida deles, pois é mais curta do que a dos humanos (excepção feita a alguns bichos que duram mais do que nós, mas são poucos). Quando trazemos um animal para casa, trazemos alguém que só nos terá a nós e que, assim, de nós dependerá sempre. Mesmo que não apeteça limpar a caixa de areia, mudar-lhes a água ou levantar do sofá para dar-lhes mais comida, há uma coisa que nos deve gritar na cabeça: eles só nos têm a nós para essas coisas todas. Não nos limpam a casa, não nos fazem o almoço, se calhar têm menos funcionalidades do que uma Bimby! Azar: eles dão-nos o que têm, seja a sua companhia, o seu afecto, a sua presença em todos os momentos. Sentem quando lhes causamos dor, têm fome se somos preguiçosos e negligentes e não os alimentamos, precisam de passear ou de uma caixa de areia limpa, mesmo que não nos apeteça sair da cama para o fazer. Ao trazê-los para casa, não trouxemos um peluche inanimado que não precisa de nada. Foi uma opção que tomámos e por isso temos de sustentá-la até ao fim. Devolver um animal porque ficou velho ou porque não dá com o mobiliário é cretinice pura. Quem o faz merecia também ser devolvido, mas dúvido que alguém aceite esse lixo de volta.