sábado, 31 de março de 2012

Coisas que Odeio XV

Sou só eu que odeio o anúncio da "Idealina" que utiliza a música do «Parabéns a Você» para publicitar uma coisa que diz que faz bem à pele? Eu achava que nunca nenhum ódio musical seria superior ao que sentia pela famosa música do Pingo Doce, mas enganei-me. A banda sonora da publicidade à "Idealina" (que eu nem sei o que seja) arrepia-me dos pés à cabeça. Então quando os alunitos mais pequenos se lembraram de começar a cantarolar aquilo pelos corredores, juro que me senti doente. Enfim, é esperar que a moda passe e que os senhores que fazem aqueles anúncios se lembrem de fazer uma publicidade menos enervante.

Leitura ensonada


Ontem comecei este. E que fique para memória futura: iniciar livros quando estamos a tombar de sono é profundamente estúpido. Hoje terei de o recomeçar porque só me lembro de que morreu alguém. Sorte macaca...

sexta-feira, 30 de março de 2012

Acabei este

Hoje acabei de ler este:


E pareceu-me que faltava ali qualquer coisa. O projecto da personagem principal está condenado deste o primeiro momento, quer pelo edifício, quer pelos vizinhos, quer pelo poltergeist que assombra o lugar. Enfim, está condenado por tudo e mais um par de botas. Ainda pensei que a personagem fosse dar luta, mas nem por isso. É daqueles livros que se termina com uma sensação esquisita. A personagem principal é muito maior do que a sua história.

Agora resolvi voltar à infância e vou lendo isto:


Das más memórias

Na "Revista" da última edição do Expresso surgia a seguinte notícia:


COMPRIMIDO DO ESQUECIMENTO

Dentro em breve, as más lembranças poderão ser apagadas definitivamente da memória com medicamentos específicos

E se existisse um comprimido que lhe permitisse apagar as suas memórias más? Um grupo de investigadores acredita ter descoberto o modo de o fazer. A chave está numa proteína chamada PKMzeta. Para nos lembrarmos de algo, o nosso cérebro sintetiza novas proteínas para estabilizar ligações entre neurónios. A PKMzeta é uma delas. Para apagar uma memória, é administrado um medicamento que bloqueia a proteína. O paciente é convidado a lembrar-se novamente dessa lembrança, mas sem a proteína não há as tais relações neuronais - e a memória em causa deixou de existir.

Os investigadores defendem que quem passa por um acontecimento doloroso deve exprimir o que sente, o mais rapidamente possível. O objectivo é que essa memória não seja "fechada" e reprimida, o que levará ao chamado stresse pós traumático. Até agora conseguia-se alterar a intensidade de certas lembranças, recorrendo a determinados fármacos. Mas elas continuavam a existir. A partir de agora, o que está em causa é apagá-las de vez.


Não sei o que pensam sobre isto, mas a mim dá-me cabo da cabeça. Sempre achei que as «memórias más» chateiam e aparecem quando menos esperamos por elas, mas também sempre considerei que  nos ensinam qualquer coisa e que as lições que delas retiramos ajudam a protegermo-nos de situações que possam ser prejudiciais. Com o tempo vamos vivendo o processo de cura da situação traumática que lhes deu origem e é esse mesmo tempo (e o que fazemos com ele) que nos modificará e tornará mais fortes, mais experientes. Se um comprimido, de repente, apagar essas más lembranças, como poderemos retirar esses ensinamentos? Como poderemos fechar as feridas que o acontecimento gerador da má memória abriu? Como poderemos evitar um espaço em branco  nas nossas memórias? É certo que todos temos lembranças de que gostaríamos de nos livrar, mas será que nos faria bem fazê-lo com um comprimido, de modo tão pouco natural? Não será muito melhor superar o trauma com a devida ajuda e aprender a conviver com as más lembranças, deixando as feridas levarem o seu tempo a sarar?

Enfim, o que concluo disto é que até o cantinho intocável da nossa memória corre sério risco de poder ser invadido e manipulado com um singelo comprimido. Talvez muitos até aplaudam a descoberta: a mim faz-me, simplesmente, muita confusão...

O jasmim


Ontem à noite apercebi-me de que estava a chover pelo cheiro a terra molhada que me invadiu a casa. Nunca tinha acontecido tal coisa. Geralmente o odor só se sente na rua, por isso concluí que a terra devia estar com uma falta de chuva tal que as primeiras pinguinhas originaram logo um aroma forte e invulgar. Hoje a chuva continua e as plantas estão felicíssimas. Ao jasmim só lhe falta sorrir.

quinta-feira, 29 de março de 2012

Olha a promoção da Wook

Ora minha gente, diz que a Wook está a dar hoje e amanhã vales de dez euros de desconto em compras superiores a trinta euros ou vales de cinco em compras com um custo maior do que quinze euros. Ide, ide, aproveitai, aproveitai!

Infidelidades - parte 2

Estão a ver tudo o que disse no outro dia sobre a cabeleireira nova, cujo trabalho era muito mais barato? Pois bem, esqueçam. À excepção do corte, de que gosto realmente, o resto correu mal e só consegui perceber quando o cabelo perdeu o ar arranjadinho próprio de quando se sai do cabeleireiro. À luz do dia e já estando com o formato desalinhado do costume, encontrei umas madeixas muito diferentes do que havia pedido.

Hoje uma outra cabeleireira, mãe daquela que sempre me alindou a crina, ofereceu-se para lhe dar um arranjo. Disse que em meia hora tratava do assunto, mas acabei de passar lá quatro horas. Com as que passei no outro dia, já lá vão oito. A dada altura tinha uma mancha amarela quase na testa. Enfim, depois de eu começar a rezar lá a coisa se compôs, ainda assim está muito longe daquilo que a outra cabeleireira fazia. O trabalho era caro, mas nunca me desiludiu.

Assim sendo, termino dizendo que afinal não vai haver infidelidade nenhuma. Já tenho o número de telemóvel da antiga cabeleireira e da próxima vez é a ela que recorro. E ponto final.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Pensamento da noite

«Cada um é filho das suas obras.»

                                                         Miguel de Cervantes


(E, por isso, há por aí muita obra podre a parir filhos ainda piores.)

Parabéns, amor!

Carta a Ângela

Para ti, meu amor, é cada sonho
de todas as palavras que escrever,
cada imagem de luz e de futuro,
cada dia dos dias que viver.

Os abismos das coisas, quem os nega,
se em nós abertos inda em nós persistem?
Quantas vezes os versos que te dou
na água dos teus olhos é que existem!

Quantas vezes chorando te alcancei
e em lágrimas de sombra nos perdemos!
As mesmas que contigo regressei
ao ritmo da vida que escolhemos.

Mais humana da terra dos caminhos
e mais certa, dos erros cometidos,
foste de novo, e sempre, a mão da esperança
nos meus versos errantes e perdidos.

Transpondo os versos vieste à minha vida
e um rio abriu-se onde era areia e dor.
Porque chegaste à hora prometida
aqui te deixo tudo, meu amor.

                         Carlos de Oliveira, in Poesias

Para ti que és tudo e que tens sido tudo, este poema. Para ti os parabéns e a alegria de comemorar este dia contigo. Não podia ser de outra maneira.


Feliz aniversário, amor.

terça-feira, 27 de março de 2012

Infidelidades

Costumava ir a uma cabeleireira de que gostava muito aqui na zona. A senhora tinha umas mãos realmente abençoadas e onde mexia era certinho que a coisa ficava bem. Só tinha um defeito: fazia uns preços absolutamente loucos para um cabeleireiro de bairro. Mas, enfim, em nome da muita qualidade que apresentava, a coisa suportava-se.
Agora a senhora despachou o cabeleireiro e foi à vidinha dela para outro sítio sem me dizer nada. Se eu soubesse para onde se mudou, talvez tivesse ido lá ter com ela porque gostava do seu trabalho e porque nestas coisas sou muito fiel e acho que cada vez que vamos a outro estabelecimento que não o «do costume» estamos a dar uma facadinha num matrimónio comercial. Vá, gozem: eu mereço. A verdade é que, no início do mês, deixei de comprar a revista Ler quando passei por ela num quiosque só para esperar que ela chegasse ao sítio onde compro os jornais e as revistas desde sempre. É certo que me fartei de esperar, mas mantive-me fiel à senhora da papelaria.

Ora, com o cabelo a coisa correu de outra forma. Desconhecendo o paradeiro da cabeleireira que adorava, tive de ir a outra. Assim, lá fui pedir um orçamento ao estabelecimento que ela havia vendido e que agora tem nova gerência. Ia desmaiando quando soube que ali fazer madeixas custava nada mais nada menos do que um quarto do que a minha adorada cabeleireira cobrava. Desconfiei muito disso porque ainda sou daquelas que acha que o preço acompanha sempre a qualidade e que quando a esmola é muita o pobre desconfia. O problema é que «o que não tem remédio remediado está» e, portanto, nada mais me restou para além de acabar na cadeira da nova cabeleireira, baratinha que só ela. E não é que gostei? Admito que a outra dava mais atenção ao pormenor, mas esta senhora puxou-me muito menos o cabelo e abdicou da hora de almoço dela para cuidar da juba que Deus me deu. No fim de contas, saí de lá loura como nunca fui na vida, mas satisfeita com o trabalho e com o facto de ter pago uns módicos trinta e oito euros por madeixas de dois tons, corte e brushing, coisa que com a outra cabeleireira me custava oitenta (e sem corte).

Portanto, cometi uma infidelidadezita, o que é feio. Mas parece-me que continuarei a pecar porque agora até já sei onde pára a minha primeira cabeleireira e não tenho qualquer vontade de a ir procurar. Nem eu nem a minha carteira que hoje está feliz, feliz, feliz...

segunda-feira, 26 de março de 2012

A Menina Sugere Isto IV

Hoje a menina não vem para aqui sugerir livros. Vem, sim, sugerir uma coisa que já lhe fazia muita falta, mas que nunca havia experimentado. Começo, por isso, dizendo que detesto untar-me em cremes. De verdade: não tenho paciência para me untar e sentir-me pegajosa durante algum tempo. Assim sendo, uso cremes quando é extremamente necessário, isto é, quando começo a parecer feita de papel.

As minhas mãos, neste Inverno, sofreram como nunca tinham sofrido. Eu lá ia pondo o creme de mãos do costume e que, em anos anteriores, fazia o efeito esperado e éramos todos felizes. Pois, mas este ano era admirável o quão secas estavam as minhas mãozitas e o quão pouco o creme podia fazer por elas. Resolvi chamar a artilharia.

Neste caso a artilharia é um creme que vi anunciarem na televisão e que me convenceu. Dizem que é bom até no frio dos países nórdicos e eu resmunguei para mim «está bem, vamos lá ver isso». Fui à farmácia, pedi o creme, não perguntei o preço e quando me disseram quanto ia pagar senti uma ligeira tontura: não estou habituada a pagar quase dez euros por pequenas bisnagas de cremes para as mãos. Mas, enfim, a factura já tinha sido feita: era pagar e calar. Olhei para a embalagem mais pequena que já vi, onde dizia «creme concentrado» e voltei a resmungar «é bom que dures muito tempo e que faças efeito, meu menino!».

E a verdade é que faz. O creme de mãos da Neutrogena é realmente fabuloso e faz milagres. Pus uma vez e passei dois dias com as mãos fofinhas. Lavei as mãos e senti que o creme continuava lá. Não ficamos besuntadas porque ele fica coladinho à pele e não passa para tudo aquilo em que tocamos. Fiquei, pois, apaixonada por ele e muito contente por verificar que foram dez euritos bem gastos.

Portanto, minha gente, se tendes as mãozinhas a precisar de ajuda, uma pelezita que escama e que resiste a todos os cremes que recebe, experimentai o Creme de Mãos Neutrogena. Eu usei o concentrado (bem disse que recorri à artilharia...), mas segundo a farmacêutica o outro também é muito bom, embora seja mais adequado para peles menos secas do que a minha. Ora ide lá experimentar que eu não quero ninguém de mãozitas secas!


Notinha da autora: O cheiro não é nada forte e tolera-se muito bem. Óptimo, é o que se quer!

domingo, 25 de março de 2012

Procuram-se candidatos

Há uma figura da nossa vida que tem sido constantemente maltrada, ostracizada, colocada à margem e que não o merece. Refiro-me ao pickle que o McDonalds coloca nos seus cheeseburguers e que recebe sempre tantas críticas.

Hoje dei por mim a olhar para ele e a dizer à minha companhia:

- Este menino faz aqui muita falta: merece uma quixotada!

Pois é, minha gente, são muitos os que preferem insultar o pickle, dizer que não faz ali falta nenhuma, retirá-lo violentamente, torcer o nariz perante a sua presença e isso é feio. O pickle faz toda a diferença e sem ele a ida ao McDonalds não seria a mesma coisa. Dão um toque de cor e um saborzinho azedo que enriquece aquela paparoca exageradamente calórica. Por isso, eu sou pelo pickle e dou-lhe muito valor. Acho, até, que devia haver um movimento em defesa dos pickles maltratados. Candidato-me já para sua presidente, desde que isso me garanta cheeseburguers gratuitos para o resto da vida. Alguém se oferece para vice-presidente do «Movimento Pró Pickle» (MPP)?...

Lapsus linguae

Ontem soube que um miúdo que tem passaritos em casa teve a seguinte conversa com uma das directoras da escola:

- Professora, os meus passarinhos andam a pôr muitos ovos. A escola não gostava de ter umas gaiolas com passarinhos?

- Não sei, P.. Temos de perguntar para saber se nos deixam tê-los aqui. Que tipo de passarinhos são?

O aluno fica com uma expressão algo confusa e, meio a medo, responde:

- Olhe professora, não sei bem, mas acho que são eróticos...

- Eróticos?!

- Sim, professora, acho que é esse o nome, mas não tenho a certeza...

A professora, que sentia uma irreprimível vontade de rir, lá percebe o que se passa e pergunta:

- P., Não quererás dizer «exóticos»?

- Sim, sim: isso!

Ai a língua portuguesa que é tão traiçoeira...

A Menina Quer Isto X


Ontem namorei-lhe o índice e vi que fala do Quixote umas quantas vezes. E vocês sabem que eu não resisto a isso...

sábado, 24 de março de 2012

A Menina Quer Isto IX

A menina quer este novo Trivial Pursuit em que se aposta se o adversário vai ou não acertar na resposta. Depois os pontos que ganhamos por acertarmos no nosso palpite pode garantir-nos queijinhos. Fofinho, não? Ai o que a menina quer dar uns apalpões neste jogo! Vamos lá a ver: ainda falta muito para o Natal?...


Nota: Imagem retirada da página http://www.autobrinca.com.

Dourar a pílula

Estou estupefacta! Hoje soube que numa escola de Lisboa uma reunião de avaliação de uma turma de 5.º ano com dez alunos teve a duração de duas horas e quarenta e cinco minutos. Como raio é isto possível? Então se fosse uma daquelas turmas como eu tenho em que a dada altura já não tenho cadeiras para todos, quanto tempo duraria a reunião?

Mas mais: uma das razões pelas quais a coisa demorou tanto a concluir-se prende-se com o facto de a psicóloga da escola ter uma palavra a dizer sobre tudo, inclusivamente as observações que os docentes anexavam às notas. Como? Mas a psicóloga tem de fazer isso? Dou-vos um exemplo: se os professores queriam dizer qualquer coisa como «o aluno A deverá empenhar-se mais no terceiro período», vinha de lá ela dizer que isso não tem qualquer mensagem positiva e que é preciso dar reforço positivo aos meninos blá blá blá. Resultado: aquilo que para os professores, que estão na sala de aula com os miúdos era assim, para ela devia ser «o aluno A deve continuar o bom trabalho». Desculpem? Mas isso não tem, de modo algum, o mesmo sentido que a frase original proposta pelos professores. Pois parece que isso não interessa nada: temos mesmo de fazer a coisa de forma elogiosa para que os alunos não fiquem tristes e desmotivados (e para que os pais também andem felizes e contentinhos). Por amor de Deus, poupem-me porque assim gastam-me depressa!

sexta-feira, 23 de março de 2012

Atirei o pau ao gato e viva o Benfica!

Eu devo ter visto mal a última notícia do Telejornal da RTP. Um pai adepto do Futebol Clube do Porto fez uma queixa ao Ministério da Educação porque no jardim de infância que a filha frequenta alteraram a letra do «Atirei o pau ao gato» e puseram o final a dizer «batata frita, viva o Benfica!». Ora, como ele é do FCP, não lhe cai bem que na escola incutam na criança a vontade de berrar vivas ao rival. Feito isto, não vai de modas e manda ao ministro Nuno Crato uma queixa indignadíssima pelo desrespeito da liberdade de escolha das criancinhas. Sabendo nós como é o ministro da educação, imaginamo-lo a rebolar-se no chão agarrado à barriga de tanto rir.

Mas o melhor ainda está para vir. O próprio Futebol Clube do Porto colocou no seu sítio online um comentário sobre o caso, a que pomposamente chamou de «A Madrassa da Ericeira» e que saúda a atitude de civismo de um pai que se revoltou contra o «proselitismo feito em escolas públicas». Que coisa maravilhosa!

Ainda segundo o Telejornal, os encarregados de educação das outras crianças mandaram também uma carta ao Ministério elogiando a escola e as suas docentes. Já foi, também, feita uma reunião com os encarregados de educação e todos parecem discordar da posição tomada pelo pai indignado.

A mim parece-me que se é para ser extremista, então sejamos à grande: como os miúdos podem um dia vir a querer ser de outra religião que não a católica, é melhor deixarmos de pedir-lhes que pintem pais natais e que façam peças em que se vestem de anjinhos em Dezembro. E como alguns não têm pais, é melhor ignorar o Dia do Pai e o Dia da Mãe. E como alguns são alérgicos aos pólenes, é melhor acabar já com as celebrações que as escolas fazem no Dia da Árvore. E como os miúdos podem vir a ser freiras e padres, também é melhor acabar já com os cartões no Dia de São Valentim que podem tornar-se ordinários em jardins de infância. Enfim, há todo um mundo de rambóias que deviam acabar já para que os meninos tenham liberdade de escolha e possam decidir, depois dos dezoito anos, por exemplo, se querem pintar cartões para dar à mãe no primeiro Domingo de Maio ou não.

Há uns tempos soube de um caso em que uma mãe de outra religião que não a católica impediu os filhos de participarem numa actividade do Dia de Reis em que os miúdos iam fazer biscoitos com forma de coroa. Os filhos dela ficaram numa sala com computadores enquanto os outros foram, literalmente, pôr a mão na massa. Contaram-me os professores que os pobres coitados ficaram de lágrimas nos olhos ao verem os colegas irem para a actividade enquanto eles ficavam devido às convicções da mãe.

E que tal deixarem, simplesmente, os miúdos serem miúdos? Leiam livros, entretenham-se, mas deixem os miúdos em paz a serem o que sabem ser: crianças. Caramba, tanto que as escolas se queixaram de que os pais não se envolviam no percurso escolar dos filhos que agora se caiu no extremo oposto. Quando já nem uma bebé pode cantar «viva o Benfica» sem o Nuno Crato receber uma queixa, muito mal vai este mundo.

Personificações caninas

A casa da minha vizinha de cima parece um hipódromo. Alguém, mais concretamente uma menina de cinco anos, corre pela casa a trote e a galope desde de manhã bem cedinho até à hora de ir dormir. Cá em baixo gramamos os «toctoctoc» todos porque não podemos ir lá acima pregar umas rasteiras à miúda, não é verdade?

Bom, mas a razão pela qual vos conto isto tem que ver com uma frase proferida pela mãe da criança quando advertida do barulho que a correria fazia ecoar por todo o prédio. Ora, a boa da senhora, em jeito de defesa, disse que de casa dela não podia vir nenhum som desses porque:

- Em minha casa a única pessoa que corre é o meu cão!

E pronto, fica esclarecido: a filha é sossegada, a pessoa que faz barulho é mesmo o cão. Eu devia falar com ele.


De cauda a abanar

Estão a ver um cão quando lhe dão um osso cheio de chicha boa lá agarrada? Pronto, hoje sinto-me mais ou menos assim (como o cão, claro, porque ser osso não deve ter gracinha nenhuma). É que hoje dei as últimas aulas antes das férias da Páscoa e vou, finalmente, ter algum tempo para descansar. Ergo as mãozinhas aos céus em jeito de agradecimento pelas duas semanas que aí vêem. E, note-se, embora tenha trabalho para fazer nas férias, poderei fazê-lo em casa e sem alunos por perto. Vá, choquem-se com a minha vontade de estar sossegada durante duas semanas. A verdade é que nesta relação entre professor e aluno as férias fazem muito bem a todos e servem tanto para eles descansarem de nós quanto nós deles.



Nota: Imagem retirada da página da Dog's Wish em http://dogswish.pt/dogs-wish/a-nossa-mascote-barf/.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Estou viva!

A semana ainda me parece muito longe do fim, mas pelo menos posso dizer que cheguei viva ao dia de hoje. Ali a uma dada altura comecei a imaginar que estava prestes a dar-me o badagaio de tão pouco que parei durante estes dias. Quem acha que os professores não fazem nada devia ter de corrigir tudo o que eu já corrigi esta semana (em dois dias) e aturar miúdos mal comportados que depois vão choramingar para junto dos pais porque a professora lhes deu um castigo «enorme»...

Durante esta semana aprendi que boa parte dos pais dos meninos são ingénuos e vão atrás dos que os filhos dizem. No meu tempo, se a minha professora me mandasse uma ficha extra para eu fazer porque me tinha portado mal, a minha mãe não ia à escola berrar com ela. Em primeiro lugar porque confiava em quem me dava aulas. Em segundo porque nunca ninguém morreu por fazer uma ficha ou conjugar uns verbos. Mas parece que agora os miúdos em idade escolar são parecidos com o Licenciado Vidreira (personagem de Cervantes) que acha que é de vidro e que se vai partir a qualquer momento. Parece-me que os pais dos meninos de agora levam isto de proteger os filhos de toda e qualquer injustiça um bocadinho ao extremo, esquecendo-se de que quem atura os filhos deles durante uma boa parte do dia são os professores. Como raio se pode deixar uma criança numa escola que se considera boa e depois pôr em causa todas as decisões que os docentes tomam? Fico com a sensação de que as escolas são sempre maravilhosas até um professor perder a paciência e pedir uma caderneta ou aplicar um castigo ou, Deus nos livre, dar uma negativa. Aí o paizinho ou a mãezinha esquecem-se de tudo e só pensam no pobre rebento, coitadinho, que vai perder uma hora de playstation para fazer o trabalho-castigo que o docente mandou ou que vai sofrer ao ver um dois na pauta. Infantilizam e fazem dos filhos uns irresponsáveis que, assim, vão aprendendo que podem tudo e que o professor tem de aguentar porque se assim não for, o pai vai lá para ter uma conversinha com ele. E os pais, quer o docente ensine bem, quer ensine mal, andam felizes da vida pelo menos enquanto a pauta só tiver notas positivas e os meninos não levarem recados na caderneta. Quando levarem desaba o mundo.

Esta mania de ver nas criancinhas principezinhos e princesinhas a quem tem de se desculpar tudo mete-me nojo e mostra-me que os maus pais não são só os que se desleixam com a educação dos filhos: são também os que agem do modo exactamente oposto, protegendo em demasia e desculpabilizando os meninos que, não raras vezes, precisavam de dois berros e uma nalgada para aprenderem a ser mais responsáveis e educados.

Estou viva, minha gente! Vêem?...


terça-feira, 20 de março de 2012

Socorro!

O dia ainda agora começou e eu já só o quero ver acabado. Hoje dou teste a duas tumas e corrijo tudo até amanhã para dar notas. Haja tinta vermelha e capacidade visual! Desejem-me sorte...

Provavelmente, até amanhã!

segunda-feira, 19 de março de 2012

Filologia românica

Hoje, durante o teste, um aluno dos meus mais pequenos chama-me para me perguntar:

- O que é "extraordinária"?

Respondi-lhe que "extraordinária", naquele contexto, significava "fantástica". Ele fica sério a pensar e depois pergunta:

- Mas "ordinária" não é "porca"? Se eu chamar "ordinária" a uma pessoa, ela não se ofende?

Respiro fundo e explico:

- Não se chama isso às pessoas. Ordinária também é uma coisa normal, vulgar.

Pensei que a coisa ia ficar por ali, mas ele, sempre sério, pergunta:

- Então "extraordinária" é "extra" + "ordinária"?

- Sim. - respondo já a dirigir-me para outro colega que me chamava. Mas ele ainda tinha uma última dúvida...

- Então, professora, se eu chamar "extraordinária" estou a chamar "muito porca a uma pessoa"?...

- Faz o teste e cala-te.

E pronto: eis como um aluno disseca a língua que fala em uns meros dois minutitos.

domingo, 18 de março de 2012

Mais livros...

Feirinha de alfarrabistas ao Domingo é quase sempre sinónimo de livros novos. Hoje a feira estava particularmente apetitosa, não percebi muito bem porquê, mas também não interessa. O resumo da história é que as minhas já de si muitíssimo carregadas prateleiras acabaram por ganhar um peso extra. Trouxe de lá os livros Gente da Terceira Classe (de José Rodrigues Miguéis), A Bela Desconhecida (de Anne Brontë) e Os Meninos Diabólicos  (de Jean Cocteau).


Mas não fiquei por aqui. No outro dia vi uma entrevista com a Ana Maria Magalhães, uma das autoras da colecção Uma Aventura, que meio mundo odeia, mas da qual eu gosto muito. E o que havia de me ocorrer ao ver a entrevista? Nada mais nada menos do que fazer a colecção inteira. Já tenho uns quantos cá em casa, agora é arranjar os que faltam. Bom, digamos que hoje fiz um investimento nesse sentido. Nesse e noutros, pelos vistos, porque não me fiquei só pelos livros Uma Aventura...



Coisas lindas

Lá fui eu feirar. Adoro feirinhas de alfarrabistas e de artesanato e por isso lá voltei eu a desgraçar a minha carteira com coisinhas fofas feitas por gente com muito talento. Na próxima vida também quero ter mãos de fada e jeitinho para actividades assim. Mas enquanto isso não acontece, eis aqui as novas aquisições:

1. Uma capa para agendas (coisa extremamente necessária, claro...):



(Que é que foi???? Gatos é o padrão do momento, ok?!)

2. Uma bolsa para guardar os óculos que andavam por aqui aos trancos e barrancos (coisa já bem necessária):



E pronto: em termos de artesanato foi isto. Tiro o meu chapéu a quem faz estas coisas tão bonitas. Apetece comprar as banquinhas em peso, mas não pode ser porque as peças vão sendo carotas. Estas até estavam baratinhas por isso vieram morar comigo. Bem-vindas!

Viagem no tempo


À professora Cacilda Neves, que me deu tudo
o que uma professora pode dar a uma aluna.


Acabei mesmo agora de fazer uma pequena viagem no tempo. Este fim-de-semana tenho de fazer os enunciados dos últimos testes do período para todas as minhas turmas e, neste momento, já só me falta fazer o do 12.º ano, que versará sobre a Mensagem. Andei para aqui a folhear livros a ver se vinha a inspiração e, a dada altura, abri a pasta gigante onde guardo os materiais do ensino secundário que sobraram dos vários escrutínios que com o tempo fui fazendo. Julgava que dentro dessa pasta só estariam os materiais da disciplina de Português porque acreditava terem sido esses os únicos que guardara, já prevendo a profissão que viria a ter. Contudo, escondidas atrás dessas folhas estavam alguns trabalhos escritos para outras disciplinas e os enunciados dos exames nacionais que fiz no final do ensino secundário: Português, História, Sociologia, Psicologia e Francês. Rabiscados, cheios de apontamentos e ali alinhadinhos, fizeram-me recordar aquelas semanas em que começava a dizer adeus à escola secundária e olá ao que viria depois. Na realidade, dizia adeus a muitas outras coisas, mas ainda bem.

Não deixa de ter graça o facto de ir agora, quase dez anos depois, virar aquela pasta como professora que procura material para fazer um teste para as suas turmas. Não deixa de haver uma certa beleza no acto de reutilizar o que a minha professora me ensinou para eu própria ensinar outros alunos. Isto de ensinar e de aprender é, no fundo, uma cadeia que por vezes continua: um docente fantástico motiva-nos ao ponto de lhe querermos seguir os passos. No meu caso, que sempre adorei os livros e que acho que temos uma literatura admirável, merecedora de respeito e de estudo, não era difícil adivinhar que o caminho seria nessa área. Porém, a questão do ensino surgiu pela mão de algumas professoras que se mostraram dignas de toda a admiração e verdadeiros modelos a seguir. Aqui fica a memória que delas tenho.

- A professora Carolina, que me ensinou a ler e a escrever e que desenhava maravilhosamente. Foi com ela que ganhei o gosto pela escola, pelos cadernos, pelos livros e foi com a sua ajuda que tracei as primeiras letras e escrevi as primeiras frases. Era um modelo pela alegria com que dava aulas a miúdos nem sempre fáceis. No fim do segundo ano foi-se embora e nunca mais a vi. A escola perdeu parte da graça que tinha. Outras professoras vieram, mas o talento não era o mesmo, por isso aquela é, para mim, a minha professora da escola primária.

- No nono ano tive uma professora de Português que se chamava Luísa Pires e foi nesse ano que essa disciplina deixou de me esgotar e passou a ser um prazer. Desde a primeira classe que estudar a nossa língua e os nossos textos me aborrecia de morte: achava sempre tudo tão fácil que me enervava e acabava por preferir as ciências, que sempre davam mais luta. Mas no nono ano deixei de me deparar com os textinhos da treta que costumeiramente apareciam nas páginas dos manuais e encontrei-me com O Auto da Barca do Inferno e com Os Lusíadas. Isto leva os alunos a fugirem, mas a mim fez-me gostar muito mais da disciplina de Língua Portuguesa e ouvir a professora com mais atenção. Cumpriu o seu trabalho de tal forma que nunca mais me esqueci do que aprendi sobre ambas as obras literárias. No final do ano deu-me um cinco e o dia em que fui à escola inscrever-me para o décimo ano foi o último em que a vi. Ainda trocámos um par de cartas, mas depois perdi-lhe o rasto. Tenho muita pena disso, gostava de saber o que foi feito dela. Espero que tenha continuado a ensinar e a motivar outros alunos para a leitura dos nossos maiores escritores: tinha um talento enorme para isso.

- No décimo ano conheci a professora Cacilda Neves. Eu e as minhas colegas saímos da primeira aula com ela a achar que tínhamos encontrado a bruxa má das histórias infantis, de tal forma era sisuda e pouco afável. Estávamos tão enganadas! Acho que ela usou a máxima de alguns professores que manda «não sorrir até ao Natal» e admiro-a por isso porque não é fácil. Foi minha professora durante os três anos do ensino secundário e não podia ter sido melhor. Conseguia cumprir os programas de uma ponta à outra e ainda arranjar tempo para nos pôr a discutir temas da actualidade. Para mim foi mais do que uma professora porque se preocupou comigo muito mais do que qualquer professora tinha feito até então. No final das aulas, deu-me um abraço enorme e desejou-me boa sorte. É uma lamechice, mas é verdade: chorámos as duas que nos fartámos. Voltei a encontrá-la ainda algumas vezes: tomámos cafés, conversámos bastante... Vi-a desiludida com o ensino, com o pouco empenho dos alunos, com o pouco trabalho que eles se dignavam a fazer. Quando eu estava a profissionalizar-me, enviei-lhe um email com uma dúvida e ela prontificou-se logo a perder uma tarde de Sábado comigo para dar-me as dicas e os conselhos que julgava necessários. Enfim, foi minha professora em sala de aula durante três anos, mas nunca deixou de me ensinar. E por isso este texto é para ela, ainda que no início não julgasse que o fosse ser. É que falar de bons professores faz-me chegar sempre à professora Cacilda: é muito por ela que aqui estou, que sou quem sou e que faço o que faço.

sábado, 17 de março de 2012

Os Simpsons

Hoje assisti a um episódio dos Simpsons que era de levar às lágrimas. No fundo, adaptaram à família de bonecos amarelos um daqueles programas que esmiuça a vida dos famosos e que vai ver a ascensão e queda das estrelas. Assim, Simpsons: behind the laugher era uma espécie de documentário que narrava o percurso mediático de Homer, Marge, Bart, Lisa e Maggie. Um narrador ia contando a sua história e as várias personagens davam, também, a sua versão da história.

A família Simpson teria, então, chegado à fama porque o belo do Homer se irritou com as séries que via na televisão, em que as famílias só se abraçavam e eram muito unidas: uma náusea, portanto. Tinha a certeza de que conseguiria fazer melhor do que aquilo e, assim, filmou um episódio no qual ele, a mulher e os filhos seriam estrelas. Tentou entregar os seus guiões e vendar a ideia aos canais de televisão, mas nunca conseguiu passar pelos seguranças. Contudo, foi bafejado pela sorte: o cabeleireiro da Marge (o responsável pelo tufo azul que só baixa quando ela está triste) era também o presidente da Fox (é preciso ter sorte com o cabeleireiro!). Foi feito um contrato e os Simpsons atingiram a categoria de estrelas, com direito a paradas na rua, a fãs histéricas que tinham de desmobilizar com canhões de água e a dinheiro que nunca mais acabava. Até o cão, o gato e os peixes dourados dos Simpsons se rebolavam em dinheiro! Uma cena maravilhosa.

E o documentário lá seguia, com as várias explicações sobre os altos e baixos na vida daquela família. Lá para o fim já me doía a barriga de tanto rir porque aquilo que estavam a fazer era uma paródia aos programas reais como o Behind the Music que vai chafurdar nas vidas das estrelas até encontrar material suficiente para poder dizer que todos os famosos já «andaram nas ruas do Algarve e comeram as passas da amargura» (cito o Balas & Bolinhos: o Regresso). Uma coisa fabulosa! Fiquei cheia de vontade de ver episódios dos Simpsons até me caírem os olhos. Andava com a mania de que aquilo já estava desgastado (é que os Simpsons já passavam na RTP2 quando eu ainda andava na primeira classe e os cromos com as figuras saíam nos Bollycaos... E isto já foi no século passado, han???), mas qual quê? Com um episódio assim parece-me que os amarelitos continuam fresquinhos como alfaces!


sexta-feira, 16 de março de 2012

Dias maus

Hoje tive uma manhã tão má, tão má, tão má que acabei a fazer uma participação disciplinar de um aluno com autismo. Para quem assistiu à cena, fiz muito bem e nem podia ser de outra maneira. Para quem não estava lá, fez confusão que eu tivesse participado de um aluno com um problema destes. A esses apeteceu-me mandá-los ir àquele sítio feio. Não o fiz, mas expliquei que a doença não pode justificar tudo e que se perdoamos todas as faltas ao respeito, então elas ficarão cada vez mais graves. Enfim... Hoje ser professora é uma real porcaria. Amanhã, que é Sábado, já saberá melhor.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Eu mereço o céu

Deixo-vos aqui um bombom (que para mim é envenenado). Não é mais do que um excerto de uma composição que me foi entregue há uns tempos e que deveria ter como tema uma viagem de que os alunos tivessem gostado e que gostassem de repetir. Este caríssimo menino resolveu contar a viagem que faz todos os dias de casa para a escola, mas escolheu descrever um dia particularmente interessante. Ora cá vai um cheirinho, já com os erros corrigidos. A negrito vão os meus comentários.

«Depois chegou o autocarro e fomos para a escola. Quando lá chegámos estavam lá os abrasados (concordo!) todos da turma à porta da escola. Tivemos as aulas todas (aposto que não foram a nenhuma) e quando fomos para casa eu fui com o P. de comboio, mas o problema foi que o passe do P. não estava carregado. Só tínhamos a opção de passar atrás de outra pessoa ou de saltar por cima das cancelas e assim foi (já calculava...). Muitas pessoas a ver e eu e o P. feitos macacos (sem comentários) a subir a cancela. Deu-nos imenso gozo (imagino...) e não parávamos de rir (nem nas aulas param)

Até estou com dúvidas: limito-me a dar zero ou dou zero e chamo lá os pais do menino e leio o texto para eles e para a directora? Custa-me a decidir... Mas uma coisa é certa: eu mereço o céu por aturar isto!

Chove

E eis que chove e troveja e quase desaba o céu, depois de uns dias de Verão ainda no Inverno. Chega a saber bem esta chuva que já não chegava há muito tempo. Nos últimos dias já via sandálias e camisolas que só costumo ver no pico do estio, o que é estranho. Aposto que hoje os telejornais já têm notícia de abertura...

Esquerda versus Direita

A todos os que, como eu, param para pensar em qual a mão esquerda e qual a mão direita, aqui fica o mais recente cartoon do extraordinário Alberto Montt. Como eu compreendo isto!

 

Carlitos, o pau

Hoje, ao dirigir-me para a sala de aula, vejo um miúdo sentado no chão e encostado a um pau grossíssimo, bom para uma fogueira. Entretanto, e antes que eu chegasse junto dele para saber a razão que o levou a precisar de um cavaco à porta da sala, chegou uma directora e perguntou-lhe que disparate era aquele. Obteve esta resposta:

- É o meu amigo e chama-se Carlitos.

Por já estarmos a ver que aquela história do pau ainda havia de dar mau resultado, este foi-lhe retirado enquantos os colegas berravam «não lhe tire o Carlitos: é amigo dele». Juro que me senti noutra dimensão, de tão disparatada que ia sendo a cena. Ora, como os miúdos arranjam sempre forma de dar a volta à questão, a segunda parte da saga «Carlitos, o pau» consistiu em o aluno desatar a chorar, dizendo que se tinha aleijado numa perna enquanto brincava no recreio e que o cavaco era a sua bengala. Se tivermos em conta que o pau não devia chegar aos quarenta centímetros e que o meu aluno não é anão, aquilo era tão bengala como eu sou um peixe de água doce.

Resumindo e concluindo: ficou mesmo sem o pau, já que este se mudou para a sala da directora, de modo a evitar-se que um dos alunos da turma acabasse por experimentar a ira do «Carlitos-amigo-bengala». No intervalo seguinte lá andava ele à procura da directora, de modo a reaver o seu amigo-pau para irem os dois, numa felicidade idílica, brincar juntos no recreio.

Às vezes estar na escola parece uma alucinação febril.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A gansa dos ovos de ouro e os seus donos

Estou a pontos de entrar em depressão. Aliás, enquanto olho para o computador pondero se devo escrever uma quixotada ou atirar-me da janela... Se calhar escrevo primeiro e voo depois, não é? Pois, pode ser que até lá passe.

Ora então diz que o sucesso do momento, o épico «Ai se eu te pego», pode ser fruto de um plágio? Estou desolada! Que a música não é nenhum original do moço louro que a canta, já se sabia, mas alegadamente a história é mais cabeluda. Segundo um grupo de jovens, a letra terá sido criada por eles durante uma viagem e partilhada com a senhora que depois a cantou e a registou como obra sua (perdoem-me o facto de não saber dar-vos os nomes das personagens desta novela, mas não me interessam nada e eu preciso de preservar a minha memória para coisas que interessam realmente). Como ela não foi um sucesso gigantesco, a coisa passou. Contudo, o moço loiro que agora a registou em seu nome parece uma máquina registadora a engavetar dinheiro (vá entender-se...) com a venda daquele êxito lindo que só ele. Ora, agora os jovens foram para os tribunais de modo a tentar embargar os lucros da música. Por enquanto conseguiram que o tribunal decidisse que fosse feito o balanço dos lucros e postos estes numa conta em que nenhuma das partes possa mexer.

Portanto é isto, minha gente: uma das músicas mais cheias de significado do momento pode ser fruto não de um plágio, mas de vários! Claro que, ao que parece, isso só começou a ser problema depois de a dita começar a facturar, mas vá... Não sejamos ruins, ainda que apeteça muito, muito.

Minha gente, a mim já me custa perceber que aquilo tenha mesmo dado uma música com existência real fora de uma noite de borga entre amigos (ah, se a poesia linda que escrevia com as minhas amigas viesse um dia a dar uma canção, provavelmente eu iria presa...), mas uma vez que deu, ponho-me na situação dos seus autores e penso «se fosse eu, escondia-me bem escondida e não contava a ninguém que tinha escrito uma coisa daquelas». Vá, estou a exagerar: um plágio é um plágio e, sempre que se comprove, deve ser punido. É tão crime quanto roubar a carteira de alguém e acho que ninguém gostaria de ver a sua carteira roubada. Enfim, aguardemos o próximo capítulo desta novela, de preferência ao som de boa música.


Torturas

A cada minuto que passa lembro-me de mais umas três ou quatro formas de tortura a aplicar a quem inventou os testes intermédios. É uma dose de trabalho que, no final de um período, só serve para roubar tempo àquilo que faz realmente falta. Enfim...

terça-feira, 13 de março de 2012

Os suiços dão uma lição

Parece que na Suiça fez-se um referendo para se decidir se as férias deviam aumentar ou não duas semanas. Ou seja, os suíços passariam de quatro para seis semanas de férias. Como lição a outros países europeus, fica o resultado: um belo e redondinho «não». O pessoal da Suíça acha que se acrescentar mais duas semanas de férias ao tempo que já têm, haverá perda de competitividade e isso não pode acontecer porque, crêem eles, isso fará com que uma situação que funciona bem se deteriore. O receio é o de que aquele tempo extra de descanso venha a provocar mazelas na economia e que, com o tempo, seja responsável pela perda de postos de trabalho e do maravilhoso nível de vida que têm. Diziam algumas pessoas na reportagem que gostam dos seus trabalhos e dos seus patrões e que acham que um alargamento das férias iria prejudicá-los muito mais do que beneficiá-los.

Mais: há uns tempos tinham feito um referendo em lhes era perguntado se queriam que tivesse lugar uma diminuição de impostos. A resposta? Outro redondo «não». No fundo, o nível de vida invejável que têm não se mantém à custa de pó de fadas, mas de trabalho e de impostos. Parece-me que naquele país se vê o retorno do que se paga e, portanto, as pessoas vivem satisfeitas com a sua contribuição, uma vez que sabem onde é aplicado o dinheiro e usufruem dos benefícios que ele proporciona (por cá temos algumas dificuldades em perceber para onde ele vai, mas enfim...).

Fiquei deliciada a ouvir isto e quase com vontade de fazer as malas. Poderão dizer-me «ah e tal, eles só cantam de galo porque vivem bem, não é com estes ordenados de miséria que por aqui há, blá blá blá blá». Muito bem, têm razão. Contudo aqui não me interessam tanto os ordenados fantásticos quanto a mentalidade de que «uma mão lava a outra e as duas lavam o rosto». Vivem como vivem porque não se importam de trabalhar, porque sabem que precisam do patrão e que o patrão precisa deles e que, portanto, remam todos para o mesmo lado. Olham para os outros países (inclusivamente para o nosso) e vêem os disparates que vamos fazendo em prol de uma boa rambóia. Aprendem com a lição: duas semanas de férias a mais era muito bonito, sim, mas pode ser um presente envenenado capaz de minar uma economia que por enquanto vai vem e recomenda-se.

Não sou bruxa, mas arriscava-me a apostar que se por cá se fizesse um referendo semelhante, provavelmente passaríamos todos a ter mais duas semanas de férias. Os argumentos seriam os de que "não são duas semanas que matam uma empresa, o que a mata é o dinheiro que os gestores metem ao bolso" (esta já é tradição), que numa empresa "quem faz alguma coisa é o trabalhador que lá deixa muito suor por tuta e meia enquanto os outros não fazem nada e conduzem brutos carros e andam para aí de fatinho" (clássica, também), entre outros. Não esqueçamos que vivemos num país onde as pessoas se identificam com um boneco ridículo como o do «Zé Povinho» que, como dizia a Maria Filomena Mónica no outro dia, é a figura do trabalhador pobre que faz um gesto feio nas costas do patrão porque não tem coragem de o enfrentar pela frente. É verdade que vivemos mal, que temos salários baixos, que perdemos poder de compra, que estamos caídos em desgraça aos olhos de boa parte da população mundial, mas parece-me que o problema também está na forma como muitos pensam que têm todos os direitos do mundo por fazerem o mínimo possível. Ainda hoje, no autocarro, ouvia uma senhora berrar, para quem a quisesse ouvir, frases pouco simpáticas e desnecessárias sobre a patroa: «Eu é que não posso ir para uma esplanada apanhar sol que a minha patroa não deixa. Isso é que era bom! A patroa lá está à minha espera...». Claro que está: é patroa, manda e paga para isso. Enfim, é um problema ao nível do modo de pensar e está visto que teríamos muito para aprender com os belos dos helvécios. Para se chegar onde eles estão não é só preciso um Governo ajuizado: também é preciso esforço e trabalho. E se por cá é verdade que temos gente muitíssimo trabalhadora, não é menos verdade que temos também muitas pessoas que julgam que o dinheiro que recebem no final do mês se deve à beleza dos seus lindos olhos e nada mais.

De ovelhas e de audiências

Mas quantas mais vezes vão os canais de televisão ocupar parte do telejornal a carpir a mudança no sistema de medição de audiências? Desde há umas duas semanas que não há dia nenhum em que não veja o José Rodrigues dos Santos apresentar um novo problema relacionado com o novo método e a empresa que o utiliza.

Eu percebo que isto das audiências incomode muito os canais. Precisam da publicidade para se aguentarem e se as audiências não forem famosas, os anunciantes piram-se para onde elas sejam apetitosas e garantam muita gente de olhinhos postos nos anúncios. Mas santa paciência: todos os dias? Resolvam lá as vossas quezílias ou então substituam os telejornais por episódios da «Ovelha Choné»: aposto que as audiências aumentam.


Amados e leais

NUM EXEMPLAR DAS GEÓRGICAS

Os livros. A sua cálida,
terna, serena pele. Amorosa
companhia. Dispostos sempre
a partilhar o sol
das suas águas. Tão dóceis,
tão calados, tão leais.
Tão luminosos na sua
branca e vegetal e cerrada
melancolia. Amados
como nenhuns outros companheiros
da alma. Tão musicais
no fluvial e transbordante
ardor de cada dia.

                               Eugénio de Andrade


in Andrade, Eugénio (2005). Antologia Breve. Porto: Fundação Eugénio de Andrade.

O «Pai Nosso»

Hoje soube que um aluno meu, dos mais pequenitos, desesperado por não conseguir fazer nada no teste de História, resolveu virar o enunciado ao contrário e escrever um «Pai Nosso» no verso da folha. A professora, ao ver aquilo, disse-lhe para se deixar de orações e para começar a fazer o teste.

Enfim, a fé do desgraçado foi abalada: teve negativa.

Haja paciência

Há uns tempos falei de vizinhos e do quanto podiam incomodar com as suas manias esquisitas e a sua costumeira falta de cuidado com o bem-estar dos outros. Bem, mal podia adivinhar que ainda aí viria coisa pior... Ora se antes acordava com alguém que saía muito cedo e que galopava escada abaixo, agora acordo (como hoje) com gente que tem ânimo para discutir aos gritos às seis da manhã, E, aparentemente, não adianta nada dizer aos senhores que se ouve tudo porque eles acham inevitável discutir. Agora, o que raio tem mesmo de ser discutido a essa madrugadora hora é já coisa que me ultrapassa. Mas poderia não ser razão desconhecida: bastava eu tirar a almofada que tinha a tapar os ouvidos e creio que perceberia o motivo para tanto berro matinal.

Sinceramente, não sei onde nos vai levar este desrespeito pelos outros. Moramos todos em sociedade, mas parece que este mundo é mais de um do que de outros. Cada vez que chega um vizinho novo até já temos medo da monomania que de lá vem. Aqui por casa já chegamos a imaginar que existe um casting antes da mudança que faz com que só venham para cá pessoas apoucadas (que me perdoem os vizinhos simpáticos e nada incomodativos que ainda vão ficando por cá). Enfim, hoje vou trabalhar com olheiras. Haja paciência.


segunda-feira, 12 de março de 2012

Brinquedos

Estava há pouco a ler a crónica do João Miguel Tavares na revista do Correio da Manhã e não consegui evitar vir aqui aplaudir o que por lá diz. No seu espaço, intitulado «Os homens precisam de mimo», falou do seu reencontro com caixas que continham os seus brinquedos de infância e do seu espanto por verificar o desgaste que aqueles objectos tinham, não por serem velhos e estarem guardados há bastante tempo, mas pelo muito uso que lhes deu. Diz ele que «Aquele era um tempo em que as coisas que se partiam ainda eram coladas; em que se voltava a agrafar cuidadosamente uma capa que desabara; em que o conceito de reciclagem era inexistente porque as coisas simplesmente não se deitavam fora. Não quero parecer velhinho (embora vá parecer velhinho), mas tenho pena de não ver nos meus filhos a mesma dedicação aos seus livros e brinquedos.»

Compreendo perfeitamente o que ele diz, embora não tenha filhos. Lembro-me de tratar os meus brinquedos como se fossem preciosidades e é muito por causa desse cuidado que hoje ainda guardo  várias coisas com que passei horas a brincar quando era mais pequena. Livros, jogos, peluches, Legos: guardo com muita estima aqueles pedaços da minha infância de que nunca me quererei desfazer. E vejo com pena, tal como o autor da crónica, a falta de cuidado e mesmo de amor da maioria dos miúdos de agora para com os seus brinquedos. Na altura, partir qualquer coisa era desolador, mas buscava-se uma solução. Quantas vezes se procurou cá em casa a solução para um brinquedo a precisar de ajuda! E hoje? Hoje a norma é deitar fora porque as coisas valem pouco e, mesmo quando foram bastante caras, não têm o valor sentimental que tinham antes. Aqueles brinquedos eram o nosso mundinho, eram nossos, nossos, nossos. Muitas vezes nem sequer eram muitos e, como tal, as razões para os estimarmos aumentavam.

Hoje parece-me tudo mais descartável. Vejo pelos meus alunos que atrás daquilo que têm virá sempre mais e, portanto, o apego é menor e o cuidado também. Lembro-me de um aluno pequenito, no ano passado, que se apaixonou por uma metralha com tripé que era caríssima. Não descansou enquanto a mãe não lha comprou. Na semana seguinte estava desiludidíssimo porque aquilo não fazia barulho como ele queria. Então convenceu a mãe a comprar-lhe uma outra pistola que vira à venda e que seria «melhor». Às compras com eles ia a irmã mais nova que tinha, aos cinco anos, uma colecção de bonecas que devia ser maior do que as das seguidoras deste blogue todas juntas. E, portanto, a cada nova ida à loja, vinha de lá mais uma boneca que a miúda, nas palavras do próprio irmão, ignorava desde o momento em que abria a caixa.

Contudo, discordo do João Miguel Tavares no que ele diz sobre a sensação de posse: «Há um lado bom nisso: ao serem mais desligados, eles não são tão possessivos como eu era. Naquele tempo, emprestar um livro era para mim um sofrimento tremendo, porque tinha uma ligação quase fetichista às minhas coisas. Mas na cultura do "partiu-se vai para o lixo" perde-se a erosão dos objectos amados.». Não creio que hoje os miúdos sejam menos possessivos do que aquilo que nós éramos: acho que são iguais ou piores. Acho que o sentimento de posse é próprio da infância e não me parece mesmo que fosse um exclusivo nosso (colheita dos anos 80). Pela minha parte posso garantir que era, sou e serei possessivíssima (palavra que nem sei se existe) com as minhas coisas, desde as mais baratuchas até às mais caras e que ia e vou à loucura quando estragam alguma coisa minha. Santa paciência, houve coisas que o tempo não curou e esta foi uma delas. A meu ver, respeitarem as minhas coisas é quase como respeitarem-me a mim: quem mas destrói falta-me ao respeito. Viro um bicho!

Enfim, e voltando à crónica, parece-me que hoje é tudo demasiado descartável e que é bem possível que muitos miúdos que hoje têm um enorme número de brinquedos se arrisquem a, daqui a umas dezenas de anos, resgatar de casa dos pais vários caixotes com coisas partidas e irreconhecíveis. Mas também, e vendo tudo por outra perspectiva, talvez  isso também seja sinal de que se divertiram muito. Não é, com certeza, aos trinta anos que criamos memórias a partir dos nossos brinquedos...


Coisas que odeio XIV

E os nervos que dá ouvir-se uma música na rádio, gostar-se dela e não sabermos de quem é e o título que tem? Ando aqui feita tonta a esmiuçar os tops das rádios para ver se descubro o nome de uma canção que ouvi ontem e não vejo jeitos. Odeio isto!

domingo, 11 de março de 2012

Rica vida

Refastelada no sofá com uma bela fatia de bolo, um chá e um camadão de sono. Pelo menos no final do fim-de-semana posso dizer «rica vida»! Pena que amanhã já seja Segunda-Feira...

Fazer o mínimo

Tendo acabado agora de classificar os testes intermédios do 12.º ano, sinto uma vontade enorme de tomar comprimidos que me ponham a dormir durante duas semanas e que me façam, depois, acordar esquecidinha de todo da enorme javardice que acabei de ver.

Não é que os disparates sejam novidade: infelizmente já vi muitos e alguns até já me proporcionaram gargalhadas (nunca me esqueci da menina que, no ano passado, a propósito do «Sermão de Santo António aos Peixes» utilizou o termo "falatória" no lugar de "oratória"...), mas o que vi nestes testes deixou-me mesmo irritada. Entendo que nem sempre os alunos percebem o texto ou que nem sempre percebem as perguntas ou, até, que nem sempre se sintem inspirados a escrever textos fabulosos. Às vezes a coisa sai mais ao lado e isso até a mim me pode acontecer. O que me fascina é que naquilo que podemos dominar, nas áreas em que é impossível perder pontos, aquela gente consiga deixá-los escapar à grande e à francesa. Dou exemplos: estão rotos de saber que não marcar adequadamente os parágrafos (coisa que se aprende na escola primária) rouba pontos. Mas escrever um pouco mais para a direita da margem não é fixe, por isso parágrafos são coisa que não existe em boa parte dos testes. Estou cansada de avisar sobre isto. Ouvem-me? Claro que não. Outro exemplo: ganhei rugas de tanto que repeti que os nomes das orações eram para estar sabidos de uma ponta ou outra. Uma oração subordinada substantiva completiva é isso e não apenas «completiva». Acham que fui ouvida? Em alguns casos não. Mais um: estou azul-estrumpfe de avisar que os limites mínimo e máximo dos textos que o enunciado pede são para ser cumpridos. Se o teste pede que escrevam um texto com, no mínimo, duzentas e, no máximo, trezentas palavras, santa paciência, é para cumprir. O que me aconteceu foram textos muito promissores, mas que obtiveram uma pontuação paupérrima em boa parte pelo desconto de pontos referente ao desrespeito pelos limites impostos (geralmente por escreverem menos do que é suposto, raramente pelo contrário).

Mais: os alunos poupam a tinta das canetas como se amanhã fosse iniciar-se uma nova guerra mundial (cruzes canhoto!) e as esferográficas viessem a tornar-se preciosidades a estimar. As respostas são curtíssimas e, muitas vezes, desrespeitam o enunciado. Por exemplo: pede-se-lhes que relacionem dois versos de um poema, que encontrem aquilo que entre eles há em comum e o que é que eles fazem? Limitam-se a falar, numa singela linha, de um dos versos. O outro é ignorado e pronto.

Já discuti isto com outros professores e a conclusão a que todos chegamos é a de que os alunos acham que fazendo o mínimo chegam lá. Em vez de escreverem as duzentas palavras escrevem cem e quem corrige que as aproveite bem. Em vez de explicarem por palavras suas o sentido de um determinado verso, limitam-se a transcrever duas ou três palavras soltas ligadas por uns disparates quaisquer e esperam que o corrector largue ali a devida pontuação (de preferência positiva) por um esforço supostamente enorme. Errado: quem corrige acaba a dar zeros atrás de zeros porque nada do que se pede vai sendo respeitado. Nem limites nem regras de ortografia, nem coisas são simples como a marcação de parágrafos. Fazer o mínimo é, muitas vezes, o mesmo que não fazer nada, mas aos alunos custa perceber isso. É por isso que as negativas aparecem em grande quantidade, deixando-os abismados porque pensavam que o que tinham feito «chegava para passar». Não fazem o que se lhes pede: fazem o que acham que chega. Pela minha parte, que ando nesta cruzada com estes meninos desde Setembro, já se me vai cansando a voz. É que lembrar gente à beira do ensino superior de que é preciso assinalar os parágrafos é vergonhoso e, parece-me, já não me devia estar a acontecer. Com este cansaço que surge quando ninguém nos ouve lembrei-me muito do nosso Camões que, quase no final d'Os Lusíadas, diz:

«No mais, Musa, no mais, que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.»
                                 (Canto X, est. 145, vv. 1-4)

Como eu o compreendo...

sábado, 10 de março de 2012

Um novo motivo para rir

Minha gente, tenho de partilhar isto convosco: a minha vida é hoje muito mais feliz do que era há duas semanas! Aliás, posso até dizer que me rio muito mais do que há um mês! Não ganhei o Euromilhões, não fui regalada com um par de sapatos novos, nem com um caixote do tamanho de uma piscina olímpica cheio de clássicos da literatura universal (embora mantenha a esperança de que tal ainda venha a acontecer).

Não: o motivo da minha súbita boa disposição é tão simples e tão parvo quanto o pode ser o pássaro de estimação do vizinho da frente. Sim, leram bem: o que me anda a deixar tolinha e com dores nos cantos da boca de tanto sorrir é muito simplesmente o rosicoli dos vizinhos que moram do outro lado da estrada. Desde que estes se mudaram que vejo umas gaiolas junto da janela, mas nunca lhes tinha prestado grande atenção. Isto até ao dia em que perdi por lá o olhar durante mais uns instantes do que o normal e me apercebi de que o rosicoli vivia quase permanentemente em cima da gaiola e não dentro dela. Ou seja: o bichinho anda por ali, tem a comida e a água fora da gaiola e passa o dia a cirandar por cima dela, junto ao vidro da janela, a ver a rua e os carros que passam. É a coisa mais fofa deste mundo. Posso até dizer-vos que, enquanto escrevo isto, ele está refasteladíssimo por cima da sua suposta casa a dar umas valentes bicadas num paninho que a dona tem sobre uma prateleira.

Ai o que eu gostava de ter um passarito assim! Ai o que eu adorava que o meu Tubo José e os seus colegas fossem assim comportados e passassem o dia do lado de fora da gaiola sem o perigo de os ver voar em direcção ao sol. Mas vá, não me posso queixar muito já que tenho um periquito apaixonado pela variante da canção do anúncio do café Mukambo que criei só para ele. Aposto que não há mais nenhum assim no mundo...

Notita com penas: Qualquer dia o vizinho acusa-me de voyeurismo e tudo por causa de um rosicoli muito educado...

Hoje é Sábado!

O Universo odeia-me: é oficial! Um breve passeio pela blogosfera mostra-me que o pessoal começa os Sábados com pequenos-almoços de sonho (o meu foi um singelo iogurte grego), a planear passeios e actividades fantásticas (já eu passarei boa parte do dia a corrigir testes, preparar aulas e inventar enunciados para as avaliações finais do período). Ah, mas antes disso, importa mudar os lençóis da cama, dar uma banhoca às gaiolas dos periquitos e fazer algumas limpezas bastante aborrecidas.

Portanto, minha gente, eu gostava muito de vir aqui deixar-vos o meu júbilo pela chegada de Sábado, pelas muitas horas de um sol radioso que estão mesmo aí, mas não me parece. Aliás, cheira-me que enquanto não chegarem as férias de Verão, não saberei o que são dias de passeios maravilhosos sob um espampanante céu azul.

Bom Sábado, minha gente!


sexta-feira, 9 de março de 2012

Os livros na moda...

Ontem vi num dos noticiários as imagens de um dos primeiros desfiles deste ano da Moda Lisboa e não pude evitar um sorriso ao constatar que o pano de fundo eram estantes cheias de livros aparentemente bastante antigos. Ou seja: o início da passarela era junto a prateleiras carregadinhas de volumes castanhos que pareciam antiquíssimos e, portanto, tornava-se difícil o olhar não fugir para lá.

Sorri porque interpretei esse facto não como uma consequência inevitável pela escolha do local onde se realiza o evento (hoje em dia consegue-se tudo e tapar estantes, ainda que altas, não custa nada), mas sim como o encarar daqueles volumes como constituindo um cenário interessante para um desfile de roupa. Portanto, de alguma forma, os livros antigos e as suas prateleiras enriquecem o desfile e formam uma imagem interessante num espectáculo que tem como cerne as roupas e os cabidezinhos com pernas que as envergam.

É irónico que um desfile de moda utilize como cenário um dos objectos que menos estão na moda. Falo de cor, mas era capaz de apostar que boa parte das pessoas que assistiram ao espectáculo não devem abrir um livro há uns valentes anos. E digo-o não porque tenha alguma coisa contra os apaixonados pela moda, mas tão somente porque os hábitos de leitura neste país andam pelas ruas da amargura, havendo por isso boas probabilidades de, naquele mesmo sítio, encontrarmos muita gente que foge da leitura como eu fujo do peixe cozido com grelos.

Mas, enfim, como nisto da moda, basta um para os rebanhos seguirem atrás, pode ser que algum dos muitos gurus que hoje apregoam o que está in e o que está out se lembre de indicar os livros como um dos acessórios obrigatórios para o próximo Outono/Inverno. Tenho a certeza de que aí o número de pessoas com um livro debaixo do braço aumentaria exponencialmente...

Adenda venenosa da autora: Duvido é que o livro alguma vez abandonasse o sovaco, onde cumpriria honrosamente o seu papel enquanto acessório de moda, para chegar, sequer, a ser aberto (quanto mais lido)...

A Menina Sugere Isto III

Hoje a menina sugere um livro que parte de uma coisa tão banal quanto um nariz para criar uma história que é, também, uma reflexão sobre o modo como nos vemos e como nos vêem. Um, Ninguém e Cem Mil, de Luigi Pirandello, foi um livro que me arrancou umas valentes gargalhadas e que conseguiu deixar-me a pensar sobre algumas questões interessantes que, uma vez por outra, acabam por assomar à nossa cabeça.

A personagem principal chama-se Vitangelo Moscarda (mas a mulher chama-o carinhosamente de "Gengè") e tem vinte e oito anos quando descobre, com a ajuda da esposa, que o seu nariz está ligeiramente torto, pendendo para o lado direito. Uma descoberta rotineira, pensará o leitor que a dada altura da sua vida terá também, com certeza, constatado alguma assimetria no próprio corpo. Contudo, Gengè não consegue ver a realidade com esta ligeireza e o facto de ter o nariz meio torto leva-o a um tal estado de obsessão que os seus comportamentos se tornam estranhos. Aliás, a partir daquele momento em que, olhando o espelho, percebe que o nariz pende um pouco para o lado direito, entra num caminho que não o levará a bom porto (pensa o leitor, que eu não vou contar como acaba). Aos poucos dedicar-se-á a uma reflexão que acompanha a sua própria história e que tem como centro aquilo que somos para os outros. Ou seja: Gengè começa a pensar que talvez aquele seu defeito físico já tivesse sido notado pelos outros sem que ele soubesse. E daí a chegar à conclusão de que aquilo que nós achamos que somos não é o que somos na realidade nem aquilo que os outros vêem, vai um pulinho. A dada altura, e em consequência de toda esta obsessão maluca que não o deixa parar de pensar no defeito que sempre ostentou sem disso se aperceber, conclui que não somos apenas um, mas vários: seremos tantos quantas as imagens que de nós tiverem os outros e nós mesmos.

É, portanto, uma boa leitura. Diverti-me imenso a ler este livro que, com uma ironia enorme, nos deixa a pensar sobre o desconhecimento que temos daquilo que somos e das imagens que projectamos; sobre a insegurança que podemos sentir quando disso temos consciência e sobre o quanto uma obsessão tão simples pode levar-nos a um estado de consciência tal que chega a roçar o absurdo. No fundo, o perceber de um pequeno defeito expõe linhas de reflexão que a todos já nos passaram pela ideia, embora nós, ao contrário do pobre Gengè, não tenhamos perdido anos de vida a pensar nelas. Terminamos o livro com o pensamento de que nem é assim tão mau ter o nível de insconsciência que frequentemente temos sobre aquilo que projectamos para os outros, já que de contrário poderíamos ser levados a muitíssimas inseguranças, como sucede com a personagem.

Este foi o último livro publicado por Luigi Pirandello, Nobel da Literatura em 1934, e, citando o texto da contracapa da edição da Cavalo de Ferro, «é considerado pela crítica como um dos pontos mais altos de toda a sua obra, onde o autor resume e aprofunda todo o seu universo, que marcou de forma original a literatura do século XX». Deixo-vos, como de costume, os seus primeiros parágrafos para tentar aguçar-vos o apetite:

« - Que estás a fazer? - perguntou-me minha mulher, ao ver que me demorava inusitadamente diante do espelho.
  - Nada - respondi-lhe -, estou a olhar para o meu nariz, para dentro desta narina. Quando carrego sinto uma dorzinha.
Minha mulher sorriu e disse:
  - Julgava que estavas a ver para que lado te pende.
Voltei-me, como um cão a quem tivessem pisado a cauda:
  - Pende? A mim? O nariz?
E minha mulher, placidamente:
  - Claro que sim, querido. Olha bem para ele: pende-te para a direita.

Tinha vinte e oito anos e até então sempre considerara o meu nariz, se não propriamente bonito, pelo menos muito decente, tal como todas as outras partes da minha pessoa. Pelo que me fora fácil admitir e alimentar a ideia que habitualmente admitem e alimentam todos os que não tiveram a infelicidade de lhes calhar em sorte um corpo disforme: que só um tolo se envaidece das suas funções. Por isso, a descoberta súbita e inesperada daquele defeito irritou-me como um castigo imerecido.»


Pirandello, Luigi (2007). Um, Ninguém e Cem Mil. Lisboa: Cavalo de Ferro Editores.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Ervas daninhas


Isto uma pessoa passa um dia sem largar uma quixotada e parece que o blogue fica cheio de ervas daninhas. Que coisa desagradável, credo!

Enfim, os dias só têm tido vinte e quatro horas (o que é uma vergonha) e, portanto, o pobre «As Minhas Quixotadas» hoje esteve sem ser afagado pela sua dona. Perdoem-me os fiéis seguidores que hoje comeram textos requentados, mas eu sou só uma e os alunos são muitos. Resultado: ganham sempre. Amanhã espero já ter mais um bocadinho de tempo para vir aqui atirar as postas de pescada do costume.

Por agora durmam bem e sonhem com palmiers cobertos!

quarta-feira, 7 de março de 2012

Já cá faltava...

Frase dita por um professor sobre o alargamento da escolaridade obrigatória para os doze anos e sobre a falta de preparação das escolas para receberem mais alunos (no Magazine de Educação divulgado pela Porto Editora este mês): «O equipamento informático que existe na escola é reduzido e avaria com frequência ou não está disponível. Também para os alunos não existe material informático que permita a sua utilização mais frequente, o que torna as aulas mais livrescas, expositivas e aborrecidas[o sublinhado é meu]

Tradução da coisa: o que é digital é bom, os livros são aborrecidos e os alunos não gostam. Beijinhos e portem-se bem.

Adenda da autora: É em boa parte por só se apreciarem as imagens, as bonecadas e os malditos powerpoints que o ensino está a nojeira que está e que os alunos fogem dos livros como eu fujo da massada de bacalhau!

Trendy, fashion e chic

No outro dia, ao receber a encomenda da Wook, verifiquei que me ofereciam um exemplar da revista Happy, que é assim muito virada para a moda e para as coisas que supostamente enchem as cabeças dos seres do sexo feminino. Ora, agora estava aqui sem nada para fazer e resolvi folheá-la. O que fui eu fazer!?! Mais valia ter bordado um paninho para o enxoval! É que agora descobri que sou burra e extremamente desactualizada. Atrevo-me mesmo a dizer que os meus conhecimentos sobre moda ficaram algures na época da Batalha do Salado!

Estava, portanto, a folhear a revista quando me deparo com um pequeno texto sobre uma senhora chamada Alexa Chung (que não sei quem seja), acompanhado de uma foto com a vestimenta da senhora (pavorosa, parece-me, mas eu não percebo nada disto). Ora, o texto dizia o seguinte:

«Nascida a 5 de Novembro de 1983 em Inglaterra, Alexa é apresentadora de televisão, modelo, colaboradora da Vogue UK e a verdadeira it girl. O seu estilo super trendy conjuga os must have de cada estação com peças mais básicas, masculinas e vestidos românticos. Tudo isto resulta num look effortless chic. Podemos vê-la frequentemente com vestidos curtos com padrões ou apontamentos femininos, conjugados com sapatos de salto alto, e denim shorts combinados com tshirts estampadas e sabrinas. A sua imagem de marca é também o cabelo desalinhado e elegante.» [os negritos são meus]

Alguém percebeu em que língua está este texto? É que as expressões que coloquei a negrito não aparecem, na revista,  nem entre aspas, nem em itálico. Deduzo, portanto, que já façam parte da língua portuguesa, apesar de apostar que se for ao dicionário não as vou encontrar por lá. E se algumas até consigo perceber o que significam, as outras são-me completamente desconhecidas, embora eu tenha ficado com a impressão de que se espera que os leitores saibam do que se tratam todas aquelas coisas. Pois bem, eu não sei e não percebi nada e também não sei explicar se o que li estava em português ou em inglês porque me pareceu qualquer coisa híbrida meio assustadora. Resumindo e concluindo: não consegui perceber se a senhora Alexa Chung é uma esteta ou não, mas a julgar pela fotografia (que neste acaso a imagem vale mesmo mais do que mil palavras) parece-me bem que anda longe disso. Enfim, ou sou eu que sou muito ignorante ou então isto é demasiado moderno para o meu Português do século XXI e ainda sem influências do Acordo Ortográfico.

Nota: Sempre aprendi que as palavras de outra língua que incluíssemos nos nossos textos deviam surgir em itálico ou, com jeitinho, entre aspas. Terei sido só eu a ir a essa aula?...