domingo, 20 de setembro de 2015

Que pergunta!


Não me dei sequer ao trabalho de sair de casa para comprar o Diário de Notícias porque consigo bem responder a esta pergunta sem precisar de ler a reportagem. Nos dias de hoje quem manda na escola são os pais. Aliás, dado o cenário, o "Pais VS. Professores" até me parece disparatado, já que não me parece que restem dúvidas sobre isto. Os pais, que outrora estiveram afastados das escolas porque não havia o costume de os envolver nessa realidade e porque também não lhes apetecia muito gastar tempo com isso (outros tempos, minha gente), transformaram agora as escolas numa extensão das suas casas e fazem com que a sua voz e os seus desejos sejam bem ouvido por todos. Bem de mais, diria eu.

Parece-me muito bem que um pai ou que uma mãe se interessem pelo percurso escolar do filho, que desejem saber como vai, se lhe corre tudo como é desejável... Por outro lado parece-me ridículo que constantemente se intrometam no trabalho dos professores, que estejam sempre à procura de aspectos que não lhes agradem para poderem deitar culpas aos docentes pelos maus resultados dos filhos. Parece-me ainda mais absurda esta cultura que agora existe e que leva os pais a considerarem ser obrigação sua ajudar os filhos com os trabalhos de casa. Conheço casos absolutamente ridículos ocorridos devido a esta mania idiota que impede, em muitos casos, a autonomia dos alunos. Sei de situações em que pais, por terem conhecimentos de uma determinada disciplina devido à profissão que exercem, explicaram uma determinada matéria ao filho. O problema é que a explicaram de forma errada e contrária à metodologia sugerida pelo programa da disciplina. Resultado final: uma criança confusa que durante as aulas confrontava a professora com o facto de ela estar "a ensinar mal", pois o pai dissera-lhe que era de outra maneira. Sei de situações em que os trabalhos de casa chegam a aparecer com a letra do pai ou da mãe, que depois juram que foi o filho que ditou e que só o fizeram porque ele estava muito cansado... Sei de cada coisa mais cabeluda que, lá está, não dúvido de que hoje quem manda na escola são os pais e que isso não é necessariamente bom. Não conheço nenhuma outra profissão em que qualquer pessoa se sinta capaz de corrigir, criticar e dar sugestões "para melhorar" como acontece com a profissão docente. Se se fala em treinadores de bancada, já vai sendo tempo de assumirmos que também existem professores de bancada e que estes existem em cada vez maior número.

Voltando aos trabalhos de casa, custa muito a um encarregado de educação perceber que se os professores os enviam é porque querem que os alunos pratiquem aquilo que aprendem na escola, de modo a consolidar os conhecimentos? Não vem dali um enorme mal ao mundo se deixarem perguntas por fazer. Não morre ninguém se existirem dúvidas que os impeçam de fazerem um trabalho perfeitinho, até porque depois, nas aulas, corrige-se o trabalho e tiram-se as dúvidas. Mas se um pai ajudou o filho nos trabalhos e meteu em demasia a sua colherada, o aluno chegará à escola confiante porque o seu trabalho estará certo, porém terá, de facto, aprendido o que havia a aprender? Pois... Depois o professor faz um teste na aula e percebe a discrepância entre os excelentes trabalhos de casa apresentados e o trabalho individual realizado na aula. Como explicar que isto não faz bem aos alunos? Em alguns casos não se explica porque há quem não queira ouvir.

Que os pais devem interagir com a escola e seguir o percurso dos filhos, até percebo e concordo com isso. Mas tem de haver limites. A intervenção dos pais deve ser um valor extra e não uma carga de trabalhos para a escola e para os professores em particular. Mais: os filhos devem ser treinados no sentido de uma maior autonomia e não para dependerem de um adulto a toda a hora, até para fazer os trabalhos de casa. Errar faz parte e aprende-se muito mais com os erros do que com os acertos. O que me parece é que nos dias que correm muitos pais não suportam ver os filhos a errar, a não serem os melhores e, em última análise, a não serem perfeitos. Por isso deitam uma mãozinha e o braço todo se preciso for para o evitar. Chegam estourados do trabalho, mas ainda se vêem obrigados a passar uma ou duas horas com os filhos para realizarem os trabalhos de casa. Claro que depois queixam-se de que os professores mandam muitos deveres e que isso prejudica a dinâmica diária da família, mas esquecem-se de que ninguém lhes pede para pararem a sua vida durante uma hora ou duas para estudarem para testes ou para resolverem as expressões numéricas do filho.

Portanto, minha gente, para mim esta reportagem nem existiria porque pressupõe uma questão que não se coloca. O que devia existir, sim, seria uma reportagem que tomasse como tema a necessidade de deixar crescer as crianças e os jovens e a importância de, por vezes, os pais darem um passo atrás e simplesmente assistirem aos erros e às quedas dos filhos (no que à aprendizagem diz respeito), sem atirarem logo a corda de salvação ao mínimo algarismo trocado, ao mais pequeno ditado que correu mal. Haverá momentos em que os alunos precisarão realmente de ajuda, mas para isso é preciso estar atento e perceber quando é, de facto, fulcral ajudar. Antes disso, deixem a escola trabalhar e as crianças crescerem.

3 comentários:

  1. Concordo contigo na maioria dos pontos, sendo que apenas parcialmente na dos trabalhos de casa. Obviamente que os trabalhos de casa devem ser feitos pelo aluno e não pelos pais (isso não está em discussão sequer, senão não aprendem nada) mas acredito que os pais deviam apoiar os filhos durante os trabalhos de casa. Não digo fazer ou explicar à maneira deles (Admito que a nível de explicação, aprendi a multiplicação e divisão mais depressa com a minha mãe do que na escola), mas apoiá-los, estar com eles durante os trabalhos de casa, acompanhá-los de maneira a que pelo menos tenham noção de onde os filhos têm mais dificuldade.

    Eu nunca tive apoio durante os TPCs mas os meus pais também não tinham estudos suficientes para mo dar a partir do 5º ano. Mas também nunca fui motivado a fazê-los em casa ou em qualquer outro ado. Isto é obviamente um ponto de vista para os pais terem em conta. A educação, a todo o nível começa em casa, e um pouco de apoio aos filhos, e não um reclamar com os trabalhos que eles não têm de fazer, iria longe.

    Pelo menos é isto que acho sobre o assunto dos TPCs.

    PS. Não tenho filhos, logo não entendo o que um pai pensa, mas tenho sobrinhos desde os dez anos, e eu era o único que lhes poderia explicar algumas coisa mas nunca o fiz... raramente mo pediam e porque sabia que eles não iriam fazer nada na mesma e esperar que os pais chegassem.

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    1. Percebo o que dizes, mas há pais que param a vida para estar ali ao lado dos meninos enquanto fazem os tpc e, enquanto professora, eu não preciso que o façam e até agradeço que deixem isso para os filhos. Claro que pode. Dar uma mãozinha muito de vez em quando e quando isso fizer sentido, mas parar a vida para estarem ali especados a fazer pergunta a pergunta com os filhos parece-me contraproducente. E depois há pais sensatos que sabem onde parar e pais que levam isto dos tpc a peito como se dali dependesse a recepção de um Prémio Nobel. Os pais têm muito trabalho ao chegarem a casa para que a sociedade ainda considere ser obrigação sua ajudar nas tarefas de matemática, de ciências, de português, de histónia no final do dia. Eu nunca tive ajuda de ninguém enquanto aluna: as dúvidas que percebia que tinha ao fazer os tpc, tirava-as na aula seguinte. Há alunos que não têm dúvidas porque não tiveram oportunidade para isso durante a realização dos trabalhos. Essas dúvidas, o perceber onde elas existem é fundamental para um professor. Enquanto docente preferia mesmo que, nesse campo, os pais dessem um passo atrás. Há muitas maneiras de apoiar a vida escolar dos filhos.

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  2. Os meus pais funcionavam à "moda antiga": só queriam resultados, e queriam lá saber o que era necessário para isso acontecer. Se houvesse algum problema na escola, era sempre culpa minha, não havia cá dúvidas nisso!
    Eu não sou contra os pais assistirem os filhos nos trabalhos de casa, nem que seja apenas dar confiança aos miúdos para colocarem o que acham certo/pensar por eles e, se tiverem dúvidas, perguntar na aula seguinte. Como em tudo, é preciso balanço (e eu como sempre tive que me desenrascar sozinha, acho que, ainda hoje, há muitos pais que não querem saber e deviam estar um pouco mais presentes).
    Mas sem dúvida que, hoje em dia, o que os paizinhos querem é que os filhos sejam os melhores e, se o seu "pudinzinho perfeito" não teve 100% no teste, a culpa é do professor. Atenção, há profs. que são um terror, mas incutir nos miúdos que eles têm que ser os melhores e que todos são culpados pelo seu insucesso, é a maior estupidez de todos os tempos. Estamos (salvo seja) a criar uma geração de miúdos petulantes e mimados que até dá medo. E a culpa, essencialmente, é, no meu entender, dos pais.
    ***

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