terça-feira, 16 de julho de 2013

Ignorância

Ando desde ontem a ouvir muitas enormidades por causa das más notas nos exames nacionais de Português, especialmente no do nono ano. O que achei mais extraordinário foi mesmo a velocidade com que muitos «professores de bancada» se apressaram a descobrir o culpado e a achincalhá-lo o mais possível. Os responsáveis pelas más notas foram, claro, os professores de cada um dos meninos a quem o exame correu mal. Esta é a opinião da maioria das pessoas que têm cuspido pérolas preciosas desde que as notas dos exames saíram.
 
Este ano não levei nenhum aluno do nono ano a exame, no entanto fiz questão de resolver a prova no dia seguinte à realização nacional da mesma. Ao terminá-la disse a quem tinha por perto que se avizinhava uma «mortantande» nas notas dos alunos do nono ano. Não porque não tenha confiança nas capacidades deles ou dos professores que os ensinaram, mas sim porque o exame era de uma complexidade abissal e porque qualquer professor de Português pode, com facilidade, constatar que aquele grau de dificuldade não é muito adequado a jovens daquele nível de ensino. Não se trata de querer facilitismo, mas de ter olhos na cara: ali pediam-se coisas que eu talvez pedisse no décimo segundo ano e não no nono. Assim, o único responsável pelos maus resultados foi o inventor de uma prova que, sendo interessante, era demasiado complexa para ser realizada com igual sucesso por alunos que se apresentaram a exame com cinco ou com três valores de nota interna (já para não falar dos outros). É isso que os «docentes de bancada» não vêem e não entendem. O exame era difícil até para o melhor dos alunos do nono ano. Recorria a saberes que poucos jovens daquela idade têm adquiridos ou consolidados. Porém, o que me irrita mais é que estas pessoas saibam apontar logo o dedo aos «parasitas» (como já li no Facebook) que são os professores quando a maioria nem olhou para a prova! Atrevo-me a dizer que a quase totalidade destes inquisidores desejosos de fogueira na Praça do Comércio não foi à página do GAVE para ver como era a prova e não espreitou os critérios de correção da mesma. Falam de cor porque já é moda neste país a culpa ser sempre dos professores. Eu até me admiro por ainda não ter sido atribuída aos docentes a crise política em que estamos! É que se chove, a culpa é nossa, mas se faz sol e calor também é! Há maus professores? Há. Aliás, há professores que não são maus: são péssimos! Assim como há maus médicos, maus enfermeiros, maus empreiteiros, maus psicólogos, maus polícias e, até, maus pais. Em todas as profissões há bom e mau, mas nenhuma é tão atacada como a profissão docente. Nenhuma classe profissional é tida como preguiçosa como esta. Fala-se dos professores e da sua profissão com um conhecimento de causa tão grande que, na maioria das vezes, só se diz lixo. Há uns tempos cheguei ao cúmulo de ler um texto de uma blogger que parecia indignada por os professores da escola do filho não assegurarem os tempos livres do menino em período de férias, como se além de tudo fossemos babysitters sazonais. Li, também, que os professores têm três meses de férias, fora as do Natal e da Páscoa. Ai sim? Então por que motivo vou trabalhar amanhã? E por que razão vou fazê-lo até ao final deste mês? Onde estão os meus três meses de férias? Viram-nos? Eu não.
 
Existe uma raiva generalizada pelos professores, profissionais outrora respeitados e acarinhados. São talvez os estranhos que mais diferença fazem na nossa vida, mas são também aqueles que a sociedade mais abomina e despreza. Se tudo corre bem o mérito é dos alunos, se tudo corre mal a culpa é nossa. Neste caso julgo que não é nem de uns nem de outros e bastava a ignorância de quem crucifica os docentes ser um pouco menor para que isso fosse rapidamente entendido. Uma rápida vista de olhos pelos exames chega para perceber o que aconteceu. Mas como parte dos que partiram logo para o ataque cego não sabe muito bem ler e escrever em condições, chego a ter dúvidas de que a consulta do exame seja suficiente. Enfim, a ignorância é uma coisa lixada...

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