segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Crónica de um adeus anunciado III


Pois se ainda há uns dias nos habituávamos à ideia de termos de dizer adeus a um dos espaços que levava a cultura portuguesa até à outra margem do Atlântico, hoje, avisou-me um amigo, começamos a despedir-nos de uma das pitorescas livrarias do Chiado que, qual aldeia gaulesa, resistia ainda ao ataque que tem sido levado a cabo pelas novas formas de venda de livros. Pois é, amigos, a grande Livraria Portugal vai fechar portas, como noticiou o jornal Público.

No fundo, quase todos nós somos um pouco culpados pelo encerramento desta e de outras livrarias como esta, já que na hora de comprar, quase todos corremos para a Fnac ou para outra grande superfície. Vamos atrás dos descontos, dos preços mínimos, da muita oferta (que às vezes nem é assim tanta quanto pensamos) e esquecemos que o pequeno comércio livreiro precisa muito da nossa ajuda para sobreviver.

Fui muitas vezes, nos meus tempos de estudante de Letras, à Livraria Portugal e lembro-me de que não foram poucas as vezes em que foi lá que consegui livros que há muito procurava para o curso. Lembro-me bastante bem de lá ter encontrado, depois de correr meio mundo, O Anjo Ancorado, do José Cardoso Pires. Foi lá que consegui encontrar o pequeno volume da INCM sobre José Saramago. Foi apenas ali que consegui uma certa edição do Quixote para oferecer há muitos anos, quando quis dar o meu livro preferido ao meu rapaz preferido. E o mais engraçado é que aquela livraria fazia-me desconto de estudante, quando lhes apresentava o cartão. Ou seja, nem havia necessidade de ir a uma grande superfície para ter desconto!

Claro que agora percebo que esse desconto em nada ajudou a Livraria Portugal, que agora vai fechar e seguir o caminho de muitos e muitos negócios neste país. Parece que o dono tentou que o espaço se mantivesse como livraria, mas ninguém pegou na ideia. Provavelmente virá a ser mais uma loja de roupa daquelas muito famosas e com sede no país aqui do lado. Provavelmente, onde antes se venderam livros, histórias, poemas, letras, passar-se-ão a vender as calças da moda e as cuecas para o Dia dos Namorados. E aposto que nessa altura encherá, ainda que não se façam descontos nas peças, ainda que tudo seja caríssimo. Mas, enfim, são estas as prioridades neste país.

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