Nos últimos dias temos ouvido falar muito na situação de milhares de professores e nas mudanças que ocorrerão nas escolas no próximo ano lectivo. Não sei como é convosco, mas a mim perturba-me ver gente com muitos anos de carreira encontrar-se agora na situação de não saber o que sucederá em Setembro. Bastantes professores com uma experiência já longa vêem-se agora premiados com o terrífico «horário zero» e com um enorme medo de, para o ano, não haver a quem possam ensinar.
Ainda antes de eu sonhar ser professora, já via na televisão as notícias que davam conta de docentes que ficavam por colocar ou que eram mandados para zonas muito distantes das suas residências. Víamos os professores de mala às costas a largar tudo para irem ao encontro do trabalho para o qual se prepararam durante muitos anos (eu levei sete anos a chegar lá, entre a Licenciatura e o Mestrado). Mas se era isso que víamos, era muito também o que ficava por ver. Por exemplo, não víamos como era difícil exercer uma função tão exigente quanto a de ensinar longe daqueles que nos apoiam e acolhem, a nossa família. Nem víamos o quanto custava a esses docentes passar pelos problemas de indisciplina e não poder falar com ninguém ao chegar a casa no fim do dia. Nem víamos (nem vemos) que muitos não tinham, com esta instabilidade, oportunidade de formar a sua própria família. No que aos professores diz respeito, é muito mais o que não se vê do que aquilo que podemos observar. Porém, e infelizmente, para algumas pessoas isso não importa nada porque a classe docente é a culpada de todos os males do mundo, são os «inúteis mais bem pagos deste país» (como foi dito um dia) e fazem um péssimo trabalho. Quem assim pensa esquece-se de que com esta instabilidade e este medo constante de este ano ter trabalho e no próximo logo se vê não ajuda a ser-se bom no que se faz. Mais: esta nova forma de participação dos pais nas escolas que passa mais pela crítica ao docente do que pelo apoio e responsabilização do aluno pelos seus actos, também não ajuda. Hoje o professor que está a trabalhar sente que tem de agradar aos pais, ainda que isso tire qualidade ao seu ensino. Mas que fazer? Os docentes são seres humanos, precisam do seu trabalho e com encarregados de educação que atiram a culpa do insucesso dos filhos para os professores, mas que tomam a do sucesso apenas para as criancinhas que se mataram a estudar que mais poderão fazer?
Os pais fazem falta nas escolas e ao longo do tempo têm vindo a ocupar nela um papel cada vez mais importante. Contudo tem-me parecido que andam no mundo da lua. Eu explico: se estão tão presentes para apontar o dedo ao docente que, "no seu entender de não formados em ensino mas com muitas opiniões para dar", não fez um bom trabalho, mais atentos deviam estar ao que está para vir. No próximo ano as turmas poderão ter um máximo de trinta alunos. Como? Trinta? Três vezes dez? Pois parece que sim. Aparentemente, quem inventou isto pensou: a) que quem ensina vinte, ensina trinta; b) que trinta por turma faz com que haja menos turmas e, consequentemente, diminui o número de docentes nas escolas. Por isto, minha gente, é que os pais deviam estar a fazer barulho. Deviam fazer-se ouvir porque isto vai retirar muita qualidade ao ensino. É verdade que um professor quando fala, tanto pode ser ouvido por um, por dez, por vinte ou por trinta. Isso é indiferente. E também é verdade que quem corrige vinte testes corrige trinta, desde que haja tempo para isso. Porém, com trinta alunos, torna-se impossível o professor poder dispender tempo indo aos lugares dos vários alunos, explicando novamente o que há para explicar, dando um apoio mais individual. Esqueçam. Mesmo numa aula de duas vezes quarenta e cinco minutos, o docente não consegue dar a matéria e apoiar os alunos como os pais gostariam e ainda corrigir trabalhos. Por isso, isto dos trinta meninos dentro de uma sala, além de me parecer perigoso por ser difícil um par de olhos ter de vigiar trinta crianças ou adolescentes, prejudica o ensino. Há probabilidades de a indisciplina aumentar e muito provavelmente muitos meninos sairão da escola com muitas dúvidas. A culpa será certamente atirada para cima do docente que não explicou (e alguns merecê-la-ão), porém seria bom que os encarregados de educação pensassem desde já no que pode um professor fazer com trinta miúdos diante de si, programas longuíssimos e, muitas vezes, poucas condições para o desenvolvimento do seu trabalho.
Enfim, a palavra de ordem é poupar, já se percebeu. E por isso corta-se nos docentes e amontoam-se alunos dentro da mesma sala. Quando me preparei para ser professora, falavam-me em currículo adaptado às características de cada aluno. Ou seja: cada aluno teria um percurso diferente do do colega porque ele próprio é diferente do colega. Muito bem: agora façam isso com TRINTA meninos dentro de uma sala. Então afinal temos tantas teorias sobre o ensino, incluem-nas na formação de professores para no final de contas não serem dadas nenhumas condições para que elas sejam aplicadas. Sim senhor, vamos bem. Eu vou ficar à espera do final do próximo ano lectivo para ver as notas dos exames e para ouvir as críticas inevitáveis ao fraco ensino que se pratica dentro das salas de aula deste país. Nessa altura provavelmente ninguém se recordará do trabalho hercúleo que foi atirado para as costas dos professores durante o ano: só será visto que as médias são baixas e que tal facto é embaraçoso.
Não tenho filhos, mas se tivesse, estaria neste momento em pânico com o que a escola passará a proporcionar daqui para a frente. E por isso, agora parece-me mais proveitoso fazer uma união de vozes do que depois, no final do ano, ouvir-se apenas uma sociedade em coro contra os professores, os únicos visíveis ao ponto de serem sempre os culpados de tudo.
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