domingo, 24 de setembro de 2017

A ver vamos

Durante dois anos estudar-se-á nas nossas escolas O Ano da Morte de Ricardo Reis em vez do habitual Memorial do Convento. Foi a decisão do Ministério e aos professores não cabe mais do que cumpri-la, como sempre...

Agora, eu até entendo que esta troca vá dar MUITO jeito a MUITA gente, mas parece-me que os alunos vão enlouquecer. Saramago é sempre bom, não há dúvidas. Falhou pouquíssimo no que escreveu e é e será, sem dúvida, um dos nossos maiores. Muitos dos seus livros poderiam ser estudados nas escolas, mas a escolha era o Memorial do Convento. Geralmente, havia duas dificuldades: a primeira, acontecia porque a maioria dos alunos não lê nada; a segunda porque já levam ideias feitas de que Saramago é impossível de ler, que não faz parágrafos (o que é mentira). Os professores aprenderam a dar a volta ao assunto e no fim muitos acabavam a gostar de conhecer a obra. A sua componente fantástica, a imagem inicial de um Rei e de uma Rainha que seguem um protocolo em vez de viverem o casamento de forma espontânea acabavam por conseguir agarrar alguns alunos. Não todos nem muitos, mas alguns acabavam por perceber que havia ali uma crítica social importante, que o Memorial tem personagens de uma força imensa, que Saramago podia escrever de forma diferente, mas com sentido.

Estou a ler agora O Ano da Morte de Ricardo Reis e a gostar. Mas enquanto leio a descrição das deambulações do protagonista não consigo deixar de pensar nos adolescentes nas escolas e de comparar a abertura deste livro com a do Memorial, chegando sempre à mesma conclusão: parece-me muito mais difícil conseguir agarrar os alunos com este romance do que com a história de Baltazar e Blimunda. Não sei como vai correr a experiência, nem tenho uma turma para assistir in loco ao que vai acontecer, mas algo me diz que o ensino de Saramago vai ser ainda mais difícil. 

Porém, nem tudo é mau. Vão vender-se muitos livros e parece-me que isso, mais do que qualquer outra coisa, é o que se quer.

2 comentários:

  1. Já eu não sou nada fã de Saramago...

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    1. A sério? Bem, não podemos gostar todos do mesmo. Eu acho-o genial, de uma inteligência e cultura admiráveis. Adoro a capacidade que teve para se "fazer", mesmo sem ter tido a facilidade que uma vida de estudos sempre traz. Adoro que tenha sido capaz de recriar a oralidade na escrita sem recorrer aos típicos sinais de escrita e que tenha sido capaz de escrever livros que exigem muito do leitor. Além de que inventou enredos fenomenais e que nos colocam as questões importantes desta vida. É o meu autor português favorito. Agora, que acho que esta mudança no Programa de Português vai ser difícil, lá isso acho.

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