domingo, 29 de junho de 2014

Sem título por falta de palavras

Durante a tarde li uma notícia do Diário de Notícias online sobre o filho da jornalista Judite de Sousa. Percebia-se que o caso era delicado, que a situação era muito grave e qualquer pessoa de bom senso compreenderia que o melhor a fazer era ficar calado ou, em caso de querer mesmo comentar a notícia, seria de bom tom e até de enorme humanidade desejar força àqueles pais. Nunca atacá-los. Fiquei, por isso, indignada e de queixo completamente caído quando caí na asneira de ler alguns dos comentários deixados à notícia em questão. Eram ofensivos, eram desumanos, eram cruéis para lá de tudo o que já se pode esperar de gente estúpida. Havia gente a dizer que a mãe merecia o que estava a sofrer, muitos que questionavam o modo como o rapaz chegou ao emprego que tinha, uma enormidade de gente a referir que não sabia por que se falava daquela pessoa e não de outras crianças que também morreram por estes dias em incêndios. Havia comentários verdadeiramente chocantes e ofensivos. Havia de tudo, mas bom senso, educação e respeito pelo próximo e pela dor alheia havia zero.
 
O filho de Judite de Sousa acabou por falecer e tinha mais ou menos a minha idade. Era filho único e, pelo que percebi por uma entrevista a que assisti há uns meses, adorado até ao infinito pela mãe. Aquele jovem sofreu um acidente que lhe roubou a vida e os seus pais devem estar a sofrer numa medida que poucos conseguirão, felizmente, algum dia imaginar e compreender. A mãe daquele rapaz é uma figura pública, mas isso não faz dela merecedora de insultos cruéis ou de analogias estúpidas (como também havia) entre o acidente vivido pelo filho e o estilo de vida de um certo jovem que ela entrevistou há tempos e que tanta confusão gerou. Independentemente de algumas cabeças não compreenderem o destaque dado ao 'desconhecido' filho de Judite de Sousa só porque a mãe é conhecida, e o relativo pouco destaque dado a outras mortes, a verdade é que há um filho que morreu, um filho único de vinte e nove anos que partiu cedo de mais e que deixou muito, mas mesmo muito por viver. Por cá fica uma mãe, que por acaso é conhecida por todos nós através do trabalho que desenvolve, que deve estar devastada e que não merece tanto ódio neste momento de dor e de enorme vazio.
 
Choca-me que existam urubus assim. Gente tão mesquinha, tão reles que se serve da internet para ferir, para magoar, para aniquilar quem já sofre. Fosse a Judite de Sousa ou o Zé da esquina: isto não se faz. A morte de um filho (ou de outro familiar) é dor suficiente para que se lhe acrescentem outras dores. Isto é pôr o dedo na ferida e regá-la com tudo o que possa fazê-la arder. Acredito que a última coisa que esta mãe venha a fazer seja ler estes comentários de gente que estando viva já morreu por dentro. Porém, se algum dia se cruzar com eles, espero que se recorde de que ainda que tanta escumalha exista, há muitas pessoas que a respeitam, que respeitam este momento de dor e que lamentam profundamente o fim de uma vida tão jovem, que tinha ainda tanto para viver. Assim como respeitam e lamentam outras vidas perdidas em famílias menos conhecidas. E isto não é nada mais do que ser-se humano, como todos devíamos verdadeiramente ser.

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