sábado, 20 de abril de 2013

A alguém que não conheci

Contava o Saramago que a avó dele, uns tempos antes de falecer, dizia algo como "O mundo é tão bonito e eu tenho tanta pena de morrer."

Soube agora da morte de uma rapariga que não conheci, mas de quem ouvi falar muito e bem. Especialmente nos últimos tempos, os da doença. Uma rapariga que deixa três meninas pequeninas, sendo que uma delas nunca chegará sequer a recordar-se do rosto da mãe já que esta soube da sua doença quando estava grávida. A menina nasceu há dois meses e a mãe morreu hoje.

Repito que nunca conheci esta senhora. Dela sabia que era filha única, que era professora, que tinha três filhas e que o pai falecera do mesmo tipo de cancro, anos antes. Quem me disse tudo isto foi a tia que, não tendo filhos, falava dela com um orgulho imenso. A Joaninha, como lhe chamava, era a sua menina. Era como uma filha e perdê-la seria, disse-mo várias vezes, a maior dor que poderia sentir na vida.

Mesmo sem ter conhecido esta pessoa, lamento muito a sua morte. Pelo sofrimento em que decorreu, pelas filhas e o marido que ficam, pela tia que perde a sobrinha que queria tanto, pela mãe que vê partir a única filha devido à mesma doença que lhe levou o marido. Não consigo sequer imaginar todas estas dores diferentes, mesmo tendo eu perdido a minha avó há três meses.

Hoje está um dia lindo. Cheio de sol e de calor. O mundo parece mais bonito num dia assim. Ao saber deste fim tão triste, lembrei-me das palavras da avó do Saramago. Ninguém devia morrer assim, ninguém devia poder partir e deixar para trás uma filha tão pequenina, ninguém devia sofrer tanto. O mundo é tão bonito e vai continuar sem a Joaninha, assim como continuou sem a minha avó. Quem hoje está a divertir-se continuará a fazê-lo sem ter noção de que mais uma tragédia aconteceu. Este será recordado como mais um maravilhoso dia de sol. Eu vou recordá-lo como um dia bonito que alguém não chegou a viver.

Descansa em paz, Joaninha.

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