segunda-feira, 20 de maio de 2019

Prioridades e o novo AO

Não é preciso muito para perceber que não gosto do Novo Acordo Ortográfico. Já aqui falei dele, particularmente quando o assunto estava na ordem do dia. Infelizmente, tive de render-me a ele na minha vida profissional. Contudo, o blogue mantém-se ainda hoje com a ortografia antiga. É uma situação um bocadinho doida, mas foi a minha opção por isso tenho de a aguentar.

Todos nós sabemos que quando o novo AO entrou em vigor, as editoras passaram a utilizá-lo e, a menos que os autores exijam o contrário, os livros aparecem com a nova grafia. Podemos até ter torcido o nariz, mas as pessoas de bom senso continuaram a querer ler e não desistiram de comprar novos livros só porque a escrita era diferente da usada até então. Repare-se: eu disse pessoas de bom senso. Infelizmente, anda por aí muita gente doida.

Quem segue editoras nas redes sociais é informada com frequência sobre as novidades que vão saindo. Com facilidade pode verificar-se que não são poucos os que aproveitam tais publicações para mandarem vir (outra vez) com o AO, dizendo que não compram livros com o novo acordo, que não lêem em “abortês” e pérolas afins. Ora, crendo no que dizem estes iluminados, sou levada a pensar que a) só compram livros de autores que escrevem pela grafia antiga e b) que não lêem nada que esteja com o novo AO, por apetitoso que possa ser o livro.

Sendo eu alguém que acha que o novo AO está pejado de idiotices e de regras que não têm lógica nenhuma, posso falar à vontade quando digo que as pessoas que cospem tais alarvidades sempre que sabem de algum novo livro prestes a sair não gostam assim tanto de ler como pensam. Abdicar de ler o que de bom ou muito bom vai saindo porque está com a nova grafia é, no mínimo, infantil. A língua sempre mudou, faz parte das suas características o facto de se alterar com os tempos, com as novas realidades. Podemos discordar de regras disparatadas que só criam confusão, mas quem gosta efectivamente de ler não deixará de querer conhecer novos autores e obras promissoras só porque não estão lá umas quantas consoantes mudas. Mais: tantos anos depois ainda andar a fazer birra com isso parece-me digno de garotos pequenos e não de gente adulta. 

Acho que não se pensou suficientemente no novo AO, acho que há regras absolutamente estúpidas e arbitrárias e que em muitos casos mudou-se sem razão lógica. Creio que tudo isto deveria ser repensado, até porque vários países que deveriam estar a usar o AO não o estão a fazer. Espero, fazendo fé numa notícia do Expresso de há algumas semanas, que se repense tudo isto e, não acabando com o AO (que seria pior a emenda que o soneto) se reponha a lógica em idiotices como a forma do verbo “parar” sem acento (acabando igual a uma preposição...). Todavia, a vida não pára e todos os dia saem livros que quero ler. Estejam com a nova grafia ou não, quero lê-los. Gosto de ler e, como tal, não posso abdicar de conhecer o que vai sendo publicado só porque não está como estaria há vinte anos. Se o nosso querido Eça ou o nosso Camilo voltassem à terra e lessem um livro com a grafia que usávamos, por exemplo, na década de 80 do século passado, também teriam um fanico. Foi antes de aplicarmos o novo AO e mesmo assim já não escrevíamos como eles escreveram em tempos. Porquê? Porque a língua não é sempre a mesma, embora algumas almas mais tacanhas achem que sim.

Por isso, caros senhores que comentam todas as publicações das editoras com impropérios contra o novo AO e que afirmam não comprarem livros que o tenham, se não querem ler, não leiam. Comprem os vossos livros sempre sem a nova grafia e ocupem-se a lê-los. Pode ser que vos falte tempo para irem torrar o juízo dos outros com birrinhas infantis e fora de prazo nas redes sociais.

1 comentário:

  1. Isso é tudo muito bonito, mas o Plano Nacional de Leitura, por exemplo, apenas admite livros escritos segundo o AO... E achar que voltar à ortografia anterior seria pior a emenda do que o soneto, olhe-se para o que há de mau no AO... É praticamente repor tudo o que estava.

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