terça-feira, 1 de agosto de 2017

Viajar pelas Letras I

O tema das viagens na literatura e da literatura de viagens (são coisas diferentes) tem estado em voga aqui no blogue. Tanto que vou dar início a mais uma sequência de quixotadas relacionadas com ambos os temas e a que chamarei «Viajar pelas Letras». E isto porque uma pessoa, por vezes, está fadada a tropeçar em coisas parecidas num curto período de tempo. Parece-me que depois do Courrier Internacional de Agosto e do romance Leão o Africano, mais um tropeço aconteceu.

Estava eu a olhar para as estantes para escolher a próxima leitura quanto topo com a volumosa «secção Steinbeck». Faço mea culpa: ainda não li nada deste senhor. Um título saltou à vista: Viagens com o Charley. Por ser uma edição antiga da Livros do Brasil, não tem sequer sinopse. Assim, submeti o livro ao teste do primeiro parágrafo (algo que os editores fazem muito, embora por vezes alarguem a um pouco mais do que apenas o primeiro parágrafo). Ora, a surpresa foi tão boa, gostei tanto do que li e achei que vinha tão a propósito do que temos falado aqui que vo-lo deixo. Antes deixem-me apenas dizer que há uma nova edição deste livro de Steinbeck. Se passarem por aqui, poderão vê-la. Assim, se gostarem do que vão ler a seguir, nem tudo está perdido, pois o livro é fácil de encontrar e poderão continuar a leitura fazendo deste, quem sabe, um dos livros do vosso Verão. Mas agora, vamos ao que interessa. Deixemos falar o senhor narrador.

     «Quando eu era muito novo e sentia em mim o impulso irreprimível de estar em qualquer outro sítio, foi-me assegurado por pessoas de idade madura que a maturidade curaria este desejo ardente. Quando os anos me indicavam como amadurecido, o remédio prescrito foi a meia-idade. Na meia-idade, asseguravam-me que uns anos mais acalmariam a minha febre, e agora, que tenho cinquenta e oito, talvez a senilidade o consiga. Nada surtiu efeito. Quatro sopros roufenhos do apito de um navio ainda arrepiam o cabelo da minha nuca e põem os meus pés a sapatear. O som de um avião de jacto, de um motor a aquecer, até o bater de cascos ferrados no pavimento, provocam o antigo estremeção, a boca seca e o olhar vago, o calor das palmas das mãos e a agitação violenta do estômago, aos pulos sob a caixa das costelas. Por outras palavras, não melhoro, ou, indo mais longe, quem foi vadio é sempre vadio. Receio que a doença seja incurável. Menciono este assunto, não para ensinar aos outros, mas para me informar a mim mesmo.»

(Meus caros «quixoteiros», o que vem a seguir é tão bom ou ainda melhor e vai ao encontro do que já tem sido referido aqui como «a arte de viajar», mas para saberem mais pormenores importa ler o livro, que é o que eu vou fazer agora. Até amanhã!)

7 comentários:

  1. Eu gosto muito de Steinbeck.
    Esse não li mas está na lista.
    Estás em boa companhia.

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    1. Estou a ADORAR este livro! Até já fui ver o que mais tenho de Steinbeck em casa e entre os meus e os do moço são muitos. Até dei pulinhos de alegria! É incrível como uma pessoa lê, lê, lê e consegue sempre surpreender-se com o que ainda desconhece. Tinha má ideia dele. Já li várias vezes que o Nobel lhe foi mal atribuído, mas sinceramente... o que importa o Nobel para nós, leitores? Ele é muito importante para quem escreve. Para nós significa pouco. Embora ainda esteja mais ou menos a meio do livro, já discordo das coisas que li em tempos sobre o autor.

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  2. Tenho esse na estante por ler! Tenho de lhe pegar. Adoro Steinbeck - já li uns poucos dele, mas nunca nenhum dos calhamaços.

    (Se tiveres o "Ratos e Homens" ou lá como se chama em português - recomendo muito)

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    1. Estou a gostar mesmo muito. Não sabia que o Steinbeck tinha tanto humor!

      Tenho sim. Até tenho dois, que isto antes de fazer uma lista era a desgraça. Ando para o ler desde que trabalhei numa livraria e o namorei por lá, mas depois metem-se sempre outros à frente. Porém, agora descobri o autor e não tenciono largá-lo muito. :)

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    2. Primeiro li Steinbecks muito deprimentes, e depois li o "Cannery Row" (que em português se chama "bairro de lata") e percebi todo o humor do senhor. É fascinante! Acho, assim pessoalmente como quem tem algum tipo de autoridade :p que devias mesmo ler o Of Mice and Men a seguir! Qualquer das duas edições :) (conheço o problema e dou graças por ter descoberto o Goodreads em 2009, sempre ajuda a orientar a coisa). É um Steinbeck sem grande humor, suponho, mas não acredito que alguém tenha lido aquele livro e ache que o Steinbeck não merecia um Nobel ou, vá, um qualquer prémio enorme de reconhecimento que o imortalizasse de alguma maneira.

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    3. Ok, vai já para a lista dos próximos a ler! 🙂

      Tive de fazer uma lista em Excel com os meus livros e agora ando a fazer uma com os do moço porque já eram tantos que não conseguia lembrar-me de tudo o que tinha e do que não tinha. Começaram a aparecer livros repetidos cá em casa. Assim com a lista no telemóvel já não há esse problema. O Goodreads nisso não me ajuda muito. Acho piada é ao desafio e a ver a quantidade de livros que li num determinado período. De outra forma não teria essa noção.

      Por falar em Goodreads, tentei procurar-te para te adicionar, mas não te encontrei. ☹️

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  3. Tratemos já disso! O link que meto no botãozinho no fundo dos meus posts não dá? Ou, tentemos:
    https://www.goodreads.com/leviathan_ que supostamente é o link directo

    ou: https://www.goodreads.com/user/show/2404656-b-rbara que é o que aparece lá em cima!

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