domingo, 6 de novembro de 2011

A pior das ignorâncias

Quem não lê não quer saber;
quem não quer saber quer errar.
                                                 Padre António Vieira


É uma tristeza ver miúdos tentarem convencer-me de que aquilo que a escola ensina não lhes serve para nada e que ler é a maior das perdas de tempo. Para muitos alunos (atrevo-me a dizer a maioria), não há qualquer interesse em aprender a falar Francês ou em saber as capitais da Europa. Ler os textos maiores da Literatura Portuguesa é ridículo e o Camões é não o príncipe dos poetas, mas o rei dos chatos.

Isto assusta, minha gente. É que um dia estes meninos que hoje dizem estas coisas serão adultos e trabalharão em bancos, nas finanças, em escolas, no Governo!... Deixarão de ser meninitos a quem se perdoa a ignorância própria da idade que provoca um profundo desprendimento por tudo o que os mais velhos dizem que importa saber e o maior dos amores pelo fácil, pelo que já está mastigado, pelo que nada ensina e em nada os melhora.

Contudo, sejamos francos, não admira que assim pensem e que assim ajam. Vivem em frente a ecrãs, bebem imagens, fogem do que não é engraçado e aprendem com os piores exemplos. Ainda que a professora os mande ler e aprender isto ou aquilo, ainda que a mãe lhes explique que a escola e o saber serão importantes para a sua vida futura, ligam a televisão e assistem com gosto ao circo dos horrores que é o orgulho em ser-se ignorante. Riem e aplaudem, porque julgam que assim a sua postura ignorante sai apoiada, as meninas sexys que entram em certos programas porque querem ser famosas e que não se embaraçam nada de admitir que não fazem a mais pálida ideia de onde fica África. Percebem que estão certos quando vêem um moço que é temporariamente uma figura pública dizer à boca cheia que não liga a política, que o nosso Presidente da Assembleia se chama Cavaco Silva e que o nosso actual Primeiro Ministro se chama José Sócrates. Acham que nós é que estamos errados quando vêem que as estrelas do momento, gente comum a tentar subir na vida com pouca roupa e sem pensar muito, também não sabem o Hino Nacional, não se ralando nada com isso e até rindo orgulhosamente com a letra que inventam ao tentar cantá-lo.

Pior que não saber é ter orgulho em ser ignorante; é rir e desculpar-se com um «não gosto de política, não me interessa para nada» por não se saber o básico sobre o assunto; é gozar com o facto de dizerem que o Brasil fica em África, como se fossem os reis do cómico e não os bobos da corte. Pior que não saber é ver que há quem defenda essa falta de conhecimentos, que passa a mão pelo pêlo e desculpa. Pior que não saber nomear nenhum país da América do Sul é verificar que depois a mãe da alma que o pronunciou diz «Eu fiquei surpreendida por ela não saber, mas... O que é que se lhe vai fazer?». Nada minha senhora. É caso perdido. Todavia, é boa e por isso o facto de ser ignorante é-lhe perdoado.

Bem-vindos ao pior dos mundos.




3 comentários:

  1. Não quis comentar apenas no Facebook, portanto venho aqui mandar a minha posta de pescada. Patrícia, a ignorância, a estupidez e o orgulho em ser irritantemente inculto fazem parte do tecido social actual. Eu não sou de invejar ninguém, mas desde que soube que uma determinada pessoa, que não possui a mais ínfima centelha de talento para escrever - diz banalidades atrás de banalidades, a sua escrita não tem qualquer sumo ou qualquer interesse - vai lançar um livro (porque tem cunhas) já acredito em tudo. Eu sei que não tem muito a ver, mas fiquei revoltado. Eu escrevo à anos, e arrogo-me a dizer que nem escrevo mal, e sempre que tento publicar o que quer que seja, recusam-me. Os Portugueses gostam do inconsequente, da calinada, da burrice, da frase feita, dos zombies desta vida.

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  2. Na minha opinião, pior ainda que a ignorância e vísivel desconhecimento é o desinteresse. Orgulharem-se de não saber e não reconhecer o valor do conhecimento. Isso sim, acho triste.
    Porque ninguém sabe tudo, mas eu procuro sempre continuar a aprender mais...

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  3. No fundo, para figuras como as que descrevi, quem sabe alguma coisa é realmente o mais estranho dos bichos. Lembro-me de quando estudava e dizia que tinha Cultura Clássica e Teoria da Literatura, muitas pessoas olhavam para mim com um ar de desprezo enorme que, geralmente, atingia o climax com a pergunta «E isso serve para quê?». Dava vontade de responder: «Olhe, minha querida, para nada. Mas sabe tão bem saber estas coisas que nem sonha!». A verdade é que serve para muito: enriqueceu-me bastante e eu, ao contrário dos que se orgulham de não saberem e se riem das asnices que dizem, tenho um orgulho enorme em saber e em não me contentar com o que sei. Por isso tentemos fazer a diferença. Não podemos mudar o Mundo, mas podemos melhorar o nosso próprio mundo e eu, no que vou podendo, tento todos os dias saber mais qualquer coisa e nunca, mas nunca, mas nunca me orgulhar daquilo que não sei.

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