sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Identidade a prazo

Hoje de manhã aproveitei para procurar no Facebook uma moça conhecida. Tinha a certeza do nome dela e procurei, procurei, procurei. Não me aparecia ninguém que correspondesse às suas características. Quando ia desistir, lembrei-me de que a dita moça casou no ano passado. Depois de um esforço mental considerável, lembrei-me do apelido do marido e pesquisei o nome próprio da moça mais o sobrenome do queridíssimo cônjuge. Et voilà! Lá me aparecia a menina que durante mais de duas dezenas de anos teve um nome e que agora tem outro.

A minha veia de estrumpfe zangado veio logo à tona porque se há coisa que não percebo é esta maluqueira de se adoptar os apelidos dos maridos. Além de considerar que é pindérico e bimbo até à exaustão, é mais uma maneira que existe de tornar as esposas numa propriedade do marido. Devido ao número considerável de moças que alteram os nomes quando casam, deduzo que muita gente terá uma opinião diferente da minha. Ainda assim não consigo perceber por que motivo alguém, ali ao fim de um terçozito de vida, resolve subterrar o nome da família em que nasceu sob o apelido da família em que nasceu o marido. Costumo dizer que nunca na minha vida taparia o nome do meu pai com o de qualquer outra família que não aquela que me viu nascer e crescer. Ah e tal, mas é o nome da pessoa com quem casarás e passarás o resto da vida blá blá blá... Pois: é o nome da família paterna dele e antes de ele existir na minha vida, eu tinha um pai, uma origem e não deixei de tê-la por casar. Com o devido respeito pelos pais e famílias dos moços deste mundo: as meninas, quando casam, não deixam de ser quem sempre foram e essa ideia de que passam das mãos dos pais para as mãos dos maridos é tão velha e podre que cheira mal. As mulheres, quando casam, levam uma identidade sua e ainda que no Cartão do Cidadão ou noutros documentos um ou outro aspecto mudem ao longo da vida, o nome, aquilo que nos designa, que é tão nosso, não devia mudar ao fim de duas ou três ou até mais décadas de existência apenas porque existe um casamento. O nome, aquele conjunto de palavrinhas que nos fará virar a cabeça sempre que, ao longo da nossa vida, o ouvirmos é nosso, faz parte da nossa história. Se o primeiro nome é aquele que a família nos escolhe (parecendo às vezes que fumou uns charros valentes antes de o fazer), os apelidos são história nossa. Vivemos num país onde o nome da mãe antecede o do pai e é por este último que seremos tratados ao longo da vida. Ou depende: eu continuarei a ouvi-lo até ao finzinho dos meus dias, enquanto outras mulheres olvidarão um pouco esse nome e distinguirão o do marido. Não concebo tal coisa, soa-me (por muito dramático que possa parecer) a uma traição a nós mesmos e à família que nos deu o nome. Se durante trinta anos me chamei Fulana X, por que motivo devo passar a chamar-me Fulana X Y, sendo Y o nome da família paterna do meu marido? Deixei de ter pai ao casar? Não, portanto não há cá mudanças nenhumas que isto da identidade não tem prazos como os iogurtes. 

Mocinhas casadoiras, vale o que vale o que vou dizer, mas deixai-vos destas tretas que além de ser lixado encontrar-vos nas redes sociais, é coisa que já não se usa. Não sois mercadoria que transacciona de pai para marido por isso deixai estar o apelidozinho, por feio que seja. Além de que se calha haver um divórcio, é uma chatice voltar ao nome original. E atentem no que digo, que tive uma professora universitária a quem isso aconteceu e quem se lixava eram os alunos que não acompanhavam estas mudanças nominais e acabavam sempre a trocar o apelido a alguém que só queria esquecer o marido e o maldito nome dele, pelo qual teve o azar de ficar conhecida...

12 comentários:

  1. É algo que eu também nunca entendi! Jamais teria outro nome que não aquele com que nasci. Mas tenho umas parentes que ainda fizeram mais, optaram pelos dois nomes: o do pai e o da mãe do "mais que tudo". Ficaram então as "maridas" com nomes de tamanho considerável. É do mais pindérico que tenho visto!
    Um dia destes, numa daquelas sessões oficiais de "passagem de bens dos familiares falecidos para os que ainda têm a sorte de acordar a mexer", quando a notária, se pôs para lá a ler o nome dos presentes eu juro que perguntei: "Mas quem é que são estas pessoas?"

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    1. Celeste, também conheço alguns casos de pessoas que adoptaram dois apelidos da família do marido e o resultado foi ficarem com nomes gigantes. Os filhos dessas pessoas também ficaram com nomes gigantes porque depois ninguém quer abdicar de nome nenhum. Enfim... É uma espécie de registo de propriedade perfeitamente dispensável, que faria algum (sublinho o 'faria') numa sociedade patriarcal, mas que vai deixando de ter qualquer lógica. O meu nome é meu e ninguém lhe mexe que eu não deixo!

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  2. Ultrapassa-me isso de adquirir o nome do marido. Não vejo utilidade nenhuma e não creio que seja a melhor maneira de mostrar dedicação a outra pessoas. Como escreveste acima, não é mercadoria para ser marcada com o nome do "proprietário".

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    1. Acho que para algumas alminhas é mesmo a ideia de que assim mostram ao marido dedicação e entrega. A mim parece-me apenas idiota.

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  3. Também me faz muita confusão essa coisa de mudar de nome só porque se casou... Mas se calhar também sou eu que verbo de uma família muito 'moderna'. Nem os meus pais e tios nem sequer nenhum dos meus avós ficou com o nome um do outro. O que naquela época não era muito normal. Se calhar se a minha mãe, avós e afins tivesse seguido essa tradição, hoje em dia talvez eu achasse normal.

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    1. A minha mãe ficou com o nome do meu pai e penso que todas as minhas tias ficaram com os apelidos dos maridos. Ainda assim, não me cabe na cabeça tal coisa. Até consigo compreender que a geração dos meus pais (hoje com mais de cinquenta anos), a dos meus avós e por aí fora o fizesse. Mas penso que agora é coisa que não faz qualquer sentido. As pessoas que o fazem não gostam mais dos cônjuges do que as que não o fazem e não há nenhum ganho com isso. A menos que depois tenham receio de virem a não ter o mesmo apelido dos filhos.

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  4. Na minha família, que me lembro, ninguém adoptou o nome de ninguém por isso nunca vi essa prática como uma tradição. Mas aqui em Inglaterra fico parva como todas as mocinhas anseiam casar para terem o nome do marido! Juro que isto era tema de conversa no meu antigo emprego e eu só pensava "mas por favor, em que século estamos nós?". Conheço até quem seja assumidamente feminista, lute pela igualdade e por toda uma série de direitos, se insurja com todas as coisinhas, por mais mínimas que sejam, que possam "melindrar" a condição da mulher e depois adoptou o nome do marido quando casou. Ora aí está uma coisa que nunca percebi. Seja como for, acho que o argumento que dão é "ah mas depois os meus filhos não têm o mesmo apelido que eu".

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    1. Se calhar para essas pessoas já é tão óbvio que casando terão o nome do marido que nem param para pensar no quão desnecessária tal coisa é. E sobretudo é pouco elogioso para a mulher que, por casar, tem de mudar de nome e adoptar o de uma família que, durante muito tempo, não foi a sua.

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    2. Não sei se é uma coisa "instituída" por acaso. Mas aqui pelo que tenho visto (e isto é só das pessoas que conheço, claro), é normalíssimo viver anos e anos juntos, ter filhos e depois casar. E então aí adoptam o nome do marido. Não percebo, honestamente. Então as conversas da hora de almoço a ver se os nomes combinam e tudo o mais, parecia-me o liceu outra vez, ahah.

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  5. Há países em que nem outra hipótese se coloca, e penso que em Inglaterra é assim!

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  6. Como eu não vou casar, essa questão não se coloca =P Mas falando a sério (não que eu esteja a brincar quando digo que não me vou casar), a verdade é que mudar de nome é uma estupidez. Da mesma maneira que ainda existe essa ideia machista (que, mesmo sendo aceite por muitas mulheres, não deixa de ser machista) que "agora que és minha mulher tens que ter o meu nome", também há a de que, ocorrendo o divórcio "agora devolve o nome, porque se não és minha mulher, ao tens direito a tê-lo". Mercadoria... isso é que era bom.
    A minha avó, que está quase nos 80 anos, nunca mudou de nome. "Era o que faltava!", chegou a dizer-me ela. Acho que havia muita mulher que devia aprender umas coisas com ela.
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    1. O que me enlouquece é haver mulheres que têm um orgulho imenso neste disparate. Ou seja: nem sequer é só pela "tradição", é porque gostam mesmo de passar a ostentar um ou dois apelidos dos maridos. Gostam disso e exibem-no com prazer. Cada um sabe de si, mas a mim isso estoura-me com os nervos.

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