Hoje fui com um amigo assistir a uma conferência sobre o livro Dom Quixote de la Mancha, na Casa Fernando Pessoa . Como era a primeira vez que íamos lá, resolvemos encontrar-nos no Rato e começar ali a pedir indicações. Lá parámos numa pastelaria (e eu cheia de vontade de ficar já por al a merendar porque tinha um rato a agigantar-se no estômago) e lá nos deram as indicações de que precisávamos. Começámos, enfim, a subir a Rua do Sol ao Rato, tal como o senhor aconselhara, mas, chegados lá acima, ficámos sem saber para onde ir. Parámos numa mercearia e voltámos a perguntar. Um senhor respondeu-nos apontando e dizendo que devíamos ir naquela direcção. O problema foi que o meu colega percebeu que era para baixo e eu percebi que era para cima. Subimos, subimos, subimos e Casa Fernando Pessoa nem vê-la. Eu estava a usar uns sapatos novos que me mordiam os pés, por isso amaldiçoava a minha sorte e praguejava muito contra o desgraçado do Fernando Pessoa (de quem não gosto muito, perdoem-me) por ter arranjado uma casa no fiofó de Judas. Enfim, já completamente perdidos, entrámos numa loja de roupa infantil para pedirmos novas indicações. A senhora que nos atendeu estava ainda mais perdida do que nós, por isso aconselhou-nos a perguntarmos no café ao lado. Lá vamos nós até ao belo do café (tasca) cheia de tipos a sugar cerveja. Enquanto o meu colega perguntava, eu apreciava o sítio e tirava grandes conclusões. Ali percebi para que é que a ASAE existe e concluí que desconhece totalmente aquele estabelecimento já que de outra forma ele estaria encerradíssimo e provavelmente já haveria sido implodido. O cheiro dentro daquele café era indescritível: parecia que albergavam um morto lá dentro e que faziam colecção de meias sujas. Mais: o cheiro fazia crer que o pessoal ia pôr os cães a urinar dentro do café. Conseguem imaginar? Os frascos com os temperos que o senhor tinha em cima do balcão pareciam ser do tempo do terramoto lisboeta e antes da reconstrução pombalina. Saí de lá com o nariz zangado por ter sido exposto a tamanha javardice. Mas o mais engraçado é que apesar de aquele café ser a maior espelunca que o mundo já viu, a verdade é que estava cheio. Enfim, vá-se lá perceber...
O senhor da tasca lá nos deu as indicações, mas ficámos tão entorpecidos com o cheiro que nos esquecemos delas. Ainda voltámos a perguntar mais duas vezes e finalmente, quase uma hora depois, lá chegámos à Casa Fernando Pessoa. Ouvimos a conferência que começou com um autodenominado «académico» a mandar vir com o conferencista pelo quarto de hora de atraso com que chegou e que concluiu com um monte de senhoras a lamberem as botas ao mesmo conferencista, recitando de cor um poema do António Gedeão sobre o Quixote. Quase se matavam a discutir sobre as edições do Quixote em Portugal e eu, que até sei umas coisas sobre o assunto, sossegadita no meu cantinho a ver o pedantismo da coisa. Já meio enjoada com tanta graxa e mais esfomeada do que o Sancho Pança em oitenta por cento das páginas que compõem a obra, tive de vir embora (alguém ao meu lado estava com um ataque de riso: era melhor ir embora antes que a coisa descambasse).
E pronto, hoje foi isto. Agora vou ali tratar das bolhas nos pés que me sobraram de tão desnorteada caminhada... Ai Quixote, a quanto me obrigas!
Ah, Filha, foi memorável. Nunca me perdi tantas vezes num sítio! A tasca era algo de inefável, mas o empregado era simpatiquíssimo. Quanto ao António Gedeão, eu estive bem melhor a recitar o meu naco de poesia e a menina esteve brilhante com o seu Camões, que também o sabia de cor. Relativamente aos ataques de riso, acho, de facto, uma pouca vergonha as pessoas irem para sítios sérios fazer essas coisas... Enfim.
ResponderEliminarDespeço-me com cumprimentos quixotescos,
Filho
As tascas de Portugal. Qualquer dia são elevadas a património cultural do mundo. Onde mais se encontram tascas como as nossas?
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