segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Aventuras num autocarro da Carris

Hoje precisei de apanhar um autocarro e senti-me de volta à aldeia da minha mãe, onde a carreira passa ao início do dia e só volta a levar as pessoas a casa à noite. Isto porque cheguei à paragem (estou a falar de Lisboa, meus caros, a capital do país) e faltavam uns fofos trinta e oito minutos para o autocarro passar. Note-se que nos horários da Carris, supostamente, ele devia passar de dezanove em dezanove minutos. Já mandei tantas reclamações à empresa que até fico enjoada de pensar em mandar mais uma. Estou bem farta de sentir que em Portugal o serviço de transportes públicos é absolutamente asqueroso. Se formos à capital do país vizinho podemos ver o que andamos a perder. Em Portugal gastam-se anos de vida com os transportes públicos! Em tempos julguei que a Carris até funcionava bem... Pois, em tempos. Foi até começar a acabar com certos autocarros e a espaçar cada vez mais a frequência dos mesmos, fora as vezes em que pelo meio dos horários falha um ou outro e os tempos de espera disparam para o dobro ou o triplo. Os passes e os bilhetes, esses, continuam ao mesmo preço. Portanto, paga-se o mesmo por uma coisa cuja qualidade só decresce.

Mas além da miséria que se passa com os transportes públicos (e que dava direito a uma série de quixotadas), ainda temos o comportamento dos seu utilizadores, que é frequentemente pavoroso. Medonho mesmo! Portanto, cheguei à paragem, esperei mais de quarenta minutos pelo autocarro, vi muita gente chegar e partir noutros autocarros que não o meu e quando este finalmente chegou, duas ou três pessoas passam-me à frente e entram, como se tivessem chegado primeiro. Outra vez: já reclamei tanto que já nem me apetece mais. Se querem ser uns merdas, sejam uns merdas. Os meus pais deram-me educação, mas parece que houve outros que devem ter andado a coçar a micose em vez de ensinar algum civismo aos filhos.

Não contente com isto tudo, ainda sou brindada com uma cena digna de um Óscar. Portanto, o autocarro chega com atraso, certo? Estamos em Lisboa, apanhamos todos os sinais vermelhos que há para apanhar e, assim, avançamos vagarosamente rumo a um destino que já me parece utópico. Como isto ainda era pouco, em determinado momento entra no autocarro uma senhora ainda jovem que devia ter um problema numa perna. Um rapaz que ia sentado com a sua esposa naqueles lugares reservados que todos conhecemos levanta-se para ajudar a senhora a entrar e a sentar-se. Ajuda-a e vai conduzi-la aos lugares reservados. Faz sentido, certo? Ela estava visivelmente mal e, portanto, faz mesmo sentido que se sente ali. Pacientemente, o motorista mantém-se parado na paragem à espera que a senhora, ajudada pelo rapaz, se sente e não caia com nenhum solavanco do autocarro. Mas o que resolve a santa mulher? Resolve que quer antes sentar-se no lugar sozinho imediatamente atrás do motorista. Exactamente: aquele que fica sobre uma roda e que portanto tem um degrau enorme. O rapaz bem lhe deu a mão, bem tentou fazer força no braço para que ela conseguisse subir para onde queria, mas ela mal conseguia levantar a perna. Houve um momento em que ainda pensei que o moço fosse fazer um degrauzinho com as mãos para ela se enfiar lá para cima. Felizmente, o motorista, que assistia àquilo com um misto de incredulidade e incompreensão, depois de ter o autocarro parado há alguns minutos, diz:

- Mas por que é que não se senta num lugar mais baixo???? 

Lá se fez luz naquela cabeça e o rapaz conduziu, então, a senhora até aos reservados. Ajuda-a a sentar-se e torna ele próprio a sentar-se ao lado da esposa. Parecia tudo acabado, mas mal as nalgas dele tocam no lugar, a senhora com o problema na perna vira-se para ele e diz:

- Quero ir para aí porque não gosto de ir de costas.

E lá se levanta o moço, ajuda a senhora a levantar-se, depois a sentar-se e vai ele mesmo sentar-se em frente à esposa. Finalmente o autocarro avança.

Há uma frase que digo muito e que é “Bondade a mais é burrice”. Cada vez que me confronto com coisas do género ou piores ainda é só dessa frase que me recordo. Se ninguém a ajudasse, estaríamos numa sociedade horrível. A senhora foi ajudada até à exaustão pelo rapaz e pelo motorista. Nunca disse “obrigada”, não tentou sequer agradecer e quando pediu para se sentar no lugar do rapaz fê-lo com rispidez. Está bem que eram lugares reservados, mas não havia mais ninguém de pé a precisar deles e acho que ficou bem claro que em caso de necessidade aquele casal cederia, com todo o gosto, o lugar. Mas julgo que nem mesmo o facto de serem lugares reservados dão direito àquela senhora, que já tinha parado um autocarro devido ao seu capricho de escolher sentar-se no lugar mais inacessível para ela, de falar assim com ninguém. Os lugares são reservados, mas que eu saiba não há nenhum asterisco que diga “E devem satisfazer-se os gostos relativamente a viajar de frente ou de costas.”. Não há asterisco, mas há uma coisa chamada “abuso” e outras que designamos por falta de educação e falta de civismo. Nos transportes públicos (mas também no trânsito em geral) isso abunda, começando pela empresa que desrespeita sistematicamente os seus horários e acabando no cidadão que não sabe que não andamos cá todos só para servi-lo.

1 comentário:

  1. Acho que já ultrapassa o civismo mas sim roça na educação das pessoas... ou na "não" educação lol

    Beijinhos,
    O meu reino da noite ~ facebook ~ bloglovin'

    ResponderEliminar