29. Personagem literária que adoras odiar
Há uma personagem literária que odeio e nem sei muito bem se adoro odiá-la. É muitíssimo importante para a acção da obra em que aparece, mas é como mosca na sopa: está lá sempre e nós, que só queremos o bem do protagonista, sentimos o sangue ferver sempre que ela aparece. Falo-vos de Mildred, do romance Servidão Humana, de Somerset Maugham. É a mulher por quem ele se apaixona e que lhe vira a vida do avesso vezes e vezes sem conta. Sempre que a personagem principal, Philip, parece escolher para si um rumo novo... eis que aparece a Mildred, que não o quer, mas que também não desaparece de vez. Mas este autor é perfeito na criação destas personagens que nos inquietam. Em Mrs. Craddock temos um marido que parece o ideal, maravilhoso, aquilo que se deseja para a vida, mas que afinal... Não parece querer uma mulher, mas sim um bibelô. O autor consegue, no entanto, construir a história de tal forma que a esposa vive até ao final sem saber se afinal o problema está nela ou nele. Nem ela nem nós. É que aos olhos de todos, aquele homem é fabuloso. Se ela é a única a ver o contrário, não estará nela o problema? Isto é Somerset Maugham: o semeador de dúvidas com a construção de personagens que nos inquietam.
No romance Para Além da Morte, de Galsworthy, vencedor do Prémio Nobel em 1932, há uma personagem masculina (penso que um violinista) por quem a protagonista se apaixona e que é execrável. A sua ignorância, soberba e a perseguição que move a Gyp, a personagem principal, transtornando a sua vida e a do seu pai doente é mais do que conseguimos aguentar sem entrar no livro e bater no malfadado músico. Com isto percebem que o romance vale bem a pena. Não ficamos indiferentes àquelas personagens.
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