A minha sina é ter cavalos a morar no andar de cima. Juro: ali não vive uma família de seres humanos, mas sim uma pequena sociedade de gente com patas a mais e cascos. Muitos cascos. Só isso explica toda a barulheira que vem de cima, as cavalgadas que fazem abanar o meu tecto e o candeeiro, mais as galopadas pela escada abaixo a cada meia hora, como se o mundo fosse acabar e dependesse da velocidade e ímpeto dos seus cascos. Tem sido uma experiência e pêras viver por baixo de gente que teria melhor lugar num picadeiro, de gente que se deita cedo de sábado para domingo, mas que faz sempre uma valente algazarra na madrugada de domingo para segunda. É lindo.
De cima vêm uivos, berros, insultos, asneiras, ameaças, cantorias, correrias, latidos, tudo! Já ouvi esta gente maltratar-se de maneiras que acho difícil alguém em Castelo de Neiva não ter ouvido, dada a dimensão que a pega assumiu. Já quase se mataram, mas com os meus equídeos vizinhos de cima tudo se resolve com uma ida à bica "para acalmar". De pochete encavada no sovaco, aí vai a matriarca, raquítica como só ela, mas com a voz mais potente que se possa imaginar. Geralmente os filhos acompanham-na, principalmente a menina de uns seis, sete anitos que vai com a mãe para o café... depois das dez da noite. É uma coisa linda.
Ouvi dizer que estão de saída. O problema é que ouvi isto em Janeiro e, a brincar a brincar, já passámos os meados de Março e nada de lhes enxergar as malas à porta. Não vejo a hora de ter todos estes cascos pelas costas, que estou fartinha de querer dormir e de não poder porque resolvem rir, madrugada dentro, como se tivessem apenas um quarto do cérebro e três ratos cegos no lugar da restante massa encefálica. Ah, se ouço estes cascos a afastarem-se de vez, até digo que é mentira...
Amiga eu sou a vizinha de cima, por cima de mim não há ninguem a não ser pombos. Mas por baixo de mim vivem equideos iguais aos de cima de ti... Tinham dois cães em casa, que não iam á rua e faziam as necessidades em casa, o xixi saia por baixo da porta, a minha vizinha da frente chamou a GNR, e quando eles tocaram á porta viram os cócó dos cães no hall de entrada, não sei o que fizeram, mas os cães (e eu adoro cães, tenho um, mas mais limpinho que as vizinhas de baixo) e a filha mais o namorado desapareceram. Portanto amiga, se o barulho fôr muito chama a GNR, eles vão lá e não precisam de dizer que foste tu.
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