sábado, 28 de janeiro de 2017

O Roberto - parte 3

A noite passada foi noite de Roberto. Para quem não sabe o que raio é isso, vão ver as quixotadas do dia 13 deste mês, que eu agora não consigo deixar-vos aqui o link. Bom, mas para quem já conhece a história, saber que foi noite de Roberto é saber que foi uma noite muito "animada". 

Começou o fandango por volta das onze e quarenta e cinco. "Roberto, deixa-me falar! Roberto, eu estou a falar!!!", assim com uns decibéis que fariam inveja aos pregoeiros da Lotaria Clássica do Natal. Um berreiro desatinado e lá estava a maluca do Roberto a tentar que o tipo sossegasse do outro lado e a deixasse dizer o muito que lhe ia na alma. O problema é que cada vez que ela tem "muito a ir-lhe pela alma" quem se lixa sou eu. Desta vez o moço também ouviu e até teve sorte porque esta noite a sessão de Roberto foi em todo o seu esplendor. Pena tive eu de não ter em casa um balde de pipocas: tinha dado jeito às três da manhã quando a menina surtou.

Sim, isso mesmo: surtou. Ora, depois de estar ali em conversações unilaterais com o seu Roberto quase à meia-noite e até já estarmos no dia de hoje, lá se calou. Não sei se saiu ou se simplesmente desligou o telefone, mas a verdade é que deixámos de ouvi-la cá em casa. Eu avisei o moço: prepara-te porque de madrugada há mais. E houve, de facto. Às duas e meia acordo estremunhada com o mesmo berreiro de antes: "Roberto, eu estou a falar! Roberto, eu estou a falar! Roberto!!!". Mas nem eu, já quase doutorada em "Roberto", podia prever o que se ia seguir. Bom, a menina tanto disse que estava a falar, tanto o mandou calar, tanto subiu os decibéis para fazer-se ouvir que, olhem, à falta de melhor descrição, só posso dizer-vos que "explodiu". Desatou a gritar histericamente, a bater em coisas ou contra as paredes, não percebemos bem, a chorar convulsivamente, como se lhe tivesse morrido a mãe. E nós ali, às escuras, de olhinhos abertos, a imaginar que com aqueles gritos ela iria com certeza transformar-se num Super-Super-Guerreiro (alguém se lembra do Dragon Ball?!). Eu gostava mesmo que vocês ouvissem, porque contado é muito difícil de acreditar. Aqueles nervos devem estar mais esburacados que os naperons que a minha mãe fazia nos idos de oitenta! Uma reacção assim a uma conversa telefónica é própria de alguém que já deixou a sanidade mental atrás e que se dirige a trote para a loucura. Aquilo que posso imaginar é que qualquer pessoa normal e com dois dedos de testa desligaria o telefone, mandaria o Roberto às urtigas, arranjaria outro bem melhor e pronto. Mas ela está definitivamente presa naquilo e, se dúvidas houvesse, o ataque de gritos agudos e descontrolados acompanhados da porrada no que lhe aparecia pela frente, prova bem que a criatura já entregou o juízo ao criador. 

Depois pus-me a pensar (e tive bastante tempo para isso, já que a madame nos deixou sem dormir até mais ou menos às quatro horas da manhã): para fazer aquela chinfrineira toda, provavelmente a moça mora sozinha. Assim sendo, será, com certeza, maior de idade. Ou seja: já não é uma adolescente de quinze anos para quem o namorado é tudo na vida e sem ele nada interessa. Mas esta criatura deve ser uma "maior de idade" que permaneceu menor de idade dentro da cabeça. Já nem falo da falta de respeito que revela para com as pessoas que vivem nos apartamentos em volta e que perdem horas de sono a aguentar uma discussão absolutamente infantil e idiota. Falo até mais do pouco amor próprio que esta alma tem para passar horas a tentar que o seu Roberto a escute (coisa que não me parece que ele queira fazer) e que se deixe chegar ao limite de tal maneira que precisa de deitar tudo para fora em forma de gritos e murros à esquerda e à direita. É doentio.

Mas, enfim, infelizmente não sei onde ela se encontra. Calculo que seja no prédio ao lado, mas não tenho a certeza e muito menos sei em que andar vive. Nem conheço a cara dela. Se soubesse onde mora, esta noite tinha-lhe enviado a polícia a casa para acabar com aquela palhaçada toda. De preferencia devia enviar-lhe os médicos do Júlio de Matos e três ou quatro coletes de forças (no estado em que ela está, duvido que um seja suficiente) e mordaças, mas pronto. Acho que mais do que mostrar-lhe que incomoda a vizinhança, estaria a fazer-lhe um favor. A ela e ao Roberto que, a julgar pela quantidade de "Roberto, eu estou a falar!", também já deve estar fartinho de a ouvir. E graças à menina e aos seus nervos mal domados, hoje moram cá em casa dois zombies, cada um mais ensonado do que o outro. Já bebi uma caneca de café e não sinto efeitos. Isto hoje promete.

3 comentários:

  1. Essa pessoa tem sérios problemas.
    Não haverá ninguém no prédio que não seja duro de ouvido? Se eu morasse no prédio já tinha chamado a polícia.
    Boa sorte, sei o aborrecimento que é.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Se ela vivesse no meu prédio, naquela noite tinha mesmo chamado a polícia. É que além do problema do barulho, é a sensação de que está ali um ser humano que precisa de ajuda. Já a tinha ouvido discutir com ele por telefone, mas nunca a tinha ouvido descontrolar-se ao ponto de gritar de desespero e de chorar daquela maneira, batendo nas paredes ou lá onde batia ela. Mas ao que parece as pessoas do prédio do lado são duras de ouvido. Elas é que deviam chamar a polícia, pois elas é que poderão abrir a porta aos agentes e indicar com certeza em que andar está a moça. Agora, parece-me que a situação já ultrapassa os limites todos.

      Eliminar
  2. Acho que, com tanto berreiro, já deve estar em super sayajin de nível quatro, os olhos raiados de vermelho, toda peluda e de cauda, pelo menos.
    Enquanto lia o texto pensava: a criatura não tem mesmo amor próprio. É preciso ser-se muito triste e perdidida da vida para se sujeitar a tal coisa. Tipo a doida que vivia no apartamento por cima de mim. Acredita que as festas dos estudantes me incomodam menos que quando a criatura entrava no modo "gritanso para a matança do porco: on". Se a profissão de carpideira ainda existisse, essa, mais a tua vizinha, faziam fortuna na boa e estariam, neste momento, a ler este post sobre elas no mais caro hotel do Dubai.
    ****

    ResponderEliminar