domingo, 8 de fevereiro de 2015

Stoner ou o melhor de 2014

No ano passado vi aparecer nas livrarias um volume cuja capa representava uma pilha de livros. Foi o suficiente para ficar interessada. Depois li a sinopse e os excertos de críticas que surgem na contracapa e badanas do livro e, sempre com alguma desconfiança, resolvi dar-lhe uma oportunidade. Assim, comprei-o.
 
Li-o ali pelo mês de Novembro e só não vos falei dele nessa altura porque julguei que o iria oferecer a alguém no Natal e não queria levantar suspeitas. Mas agora que já estamos bem longe dessa quadra, deixem-me dizer-vos que as críticas positivas ao livro não são mentira nem publicidade enganosa. Stoner é mesmo do MELHOR que já li na vida. Vale cada página, cada linha, cada letra e, sobretudo, cada minuto do vosso tempo. É daqueles livros em que, chegados ao final, sentimos um enorme murro no estômago devido à história que acabámos de ler e ao facto de já ter terminado e de precisarmos de aprender a viver sem a sua companhia. Foi dos poucos livros que tive dificuldade em largar, coisa que é magnífica em mim, pois geralmente sou fabulosa a refrear o empolgamento que alguns livros me provocam. Com Stoner fui uma leitora devoradora, o que é raríssimo em mim. Mas, de facto, este livro é um diamante que andou escondido durante demasiado tempo. Comummente não releio livros, contudo já sinto a vontade de reler este romance e só o terminei em Novembro. É mesmo um texto fora do comum e vale bem a pena.
 
A história é a de um professor universitário conhecido pelo seu apelido: Stoner. É enviado para a universidade pelos pais agricultores, pois tinham a esperança de que ele viesse a aprender mais sobre agricultura e que, assim, conseguisse prosseguir com êxito o seu trabalho no campo. Contudo, na universidade, Stoner cruza-se com a disciplina de Literatura Inglesa e deslumbra-se de tal forma que altera todo o rumo da sua vida. Acabará criando um brilhante (ou não) percurso universitário, num meio onde nem sempre reina a honestidade ou a competência. Viverá apaixonado pelos clássicos e procurará passar esse gosto aos seus alunos. Paralelamente à sua vida profissional, decorrerão muitos casos na sua vida pessoal que ajudam a formar a pessoa em que se tornará (ainda que por vezes a personagem pareça um daqueles sacos de boxe que apanha pacientemente todos os golpes que lhe são dirigidos e que não responde nunca aos ataques maquiavélicos de que é alvo). No fundo, é como se o seu trabalho enquanto professor universitário fosse o rio e como se o resto fossem os pequenos braços que se separam, mas cujas águas não deixam de voltar ao rio principal.
 
O livro está escrito num ritmo perfeito. A história avança de maneira a que nunca nos esqueçamos dela, mas também existe algum espaço dado a descrições que se tornam importantes para que imaginemos melhor o cenário de toda a acção ou as personagens que rodeiam o professor Stoner. Começamos, com tudo isto, a ser sombras que caminham ao lado da personagem de modo a ver tudo aquilo que faz, pensa e diz. Deixamos de ser leitores que, deitados no sofá, lêem uma boa história. É clichê, mas é verdade: entramos pelo livro dentro e assistimos às aulas de Stoner, às tardes que passa em boa companhia, às reuniões para as quais é chamado, à passividade com que (não) reage ao mal que lhe vão fazendo. Apetece-nos beliscá-lo para que não se deixe enganar; para que tome as rédeas da sua vida; para que vá ao médico quando chega o momento decisivo. Raramente me sucedeu isto com um livro.
 
Por isso aconselho-vo-lo. De verdade: foi um dos melhores livros que li até hoje e é delicioso ainda ser surpreendida desta maneira por um livro que já existe há tanto tempo, mas de que nunca ouvira falar. Se ainda não têm lista para a futura Feira do Livro de Lisboa, força: acrescentem-no. Porém, acho que deviam correr já para uma livraria e não esperar muito mais para conhecer as aventuras e desventuras do professor Stoner. E devem correr ainda mais todos aqueles que se movem no meio académico e que assistem com um misto de assombro e de curiosidade aos filmes que nele decorrem. Com Stoner recebemos um cheirinho daquilo que é a vida de um professor que descobre uma vocação, que a vive profissionalmente e que, pelo meio, se confronta com a mesquinhez de um meio que tem tanto de encantador quanto de sujo. É um livro para os universitários que sempre existirão em nós e para os seres humanos que sempre seremos, com o que nisso existe de virtude e de defeito.


Nota: Como bem se vê, a imagem saiu da página da Wook.

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