sábado, 28 de setembro de 2013

Mau comportamento no ensino superior

Esta pequena chamada está na capa do Expresso que, extraordinariamente, saiu à sexta-feita (espertalhões...). Não li a notícia, apenas isto e, embora a imagem esteja com má qualidade, o que aqui diz é que o «Mau comportamento leva universidades a criar castigos. Uso de telemóveis nas aulas é um dos maiores focos de perturbação» e logo de seguida «Professores lamentam que estudantes estejam a chegar cada vez mais imaturos ao Ensino Superior. No passado ano letivo, pelo menos oito universidades instauraram processos disciplinares a 35 estudantes. Vários foram suspensos das aulas.» (sublinhado meu).
 
Importa-me começar por dizer que cavaria um buraco e enfiar-me-ia lá dentro se numa faculdade ou em qualquer outro estabelecimento de ensino superior alguém tivesse de me castigar pelo meu mau comportamento. Aliás, se tal coisa acontecesse com um filho meu, tenho a impressão que lhe punha as costas em brasa de tanto o varar. Por outro lado, já não me choca assim tanto ler esta pequena notícia: eu estava a terminar o mestrado quando a «geração Morangos com Açúcar», como lhe chamávamos, chegou ao ensino superior. Ora, se havia meninos e meninas atinadinhos, que se divertiam, mas com responsabilidade, havia uma avalanche deles que encaravam aquele espaço como um prolongamento das noitadas de sábado. Invadiam os bares da faculdade e consumiam cerveja como se estivessem a armazená-la em bossas, enquanto jogavam PSP (eu vi isto!) nas horas em que deviam estar nas aulas. Não imagino como tais criaturas seriam dentro de uma sala de aula, mas posso fazer uma pequena ideia.
 
O problema é que o ensino superior não é obrigatório e só vai para lá quem supostamente quer continuar, por alguma razão, a sua formação. Ora, creio que nos dias de hoje, muitos miúdos fazem o secundário com a certeza de que os estudos continuarão, mas sem saberem muito bem porquê. Vão porque os pais nem dão outra hipótese e porque não se sentem tentados a trabalhar em qualquer coisa que não exija o diploma universitário. Vão com a cabeça nas praxes e nas festas e nos trajes e na vida académica, esquecendo-se muitos deles de que a vida académica também passa pelas aulas, pelos exames e pelas notas. Um "canudo" com um dez vale pouco, por isso importa subir as notas.
 
O ensino superior está agora a apanhar com os estilhaços da bomba que rebentou nas mãos dos docentes do terceiro ciclo e do ensino secundário há alguns anos. É lamentável e vergonhoso que uma fase do ensino em que se aprende porque se quer e em que, supostamente também, aprendemos aquilo de que gostamos seja um prolongamento da basófia e falta de educação que preencheu o ensino secundário. Novamente: eu cobria-me de vergonha e trancava-me em casa durante um século se um docente universitário, uma pessoa que provavelmente sabe mais do que aquilo que vou conseguir saber na minha vida toda, tivesse de reportar o meu comportamento a outras entidades no sentido de ser-me aplicado um castigo que pode passar pela suspensão! Bem sei que as liberdades que o ensino universitário permite, por ser aquela fase em que já somos crescidos o suficiente para sabermos o que andamos a fazer, pode ser aliciante e levar os alunos a distorcerem-na e aumentarem-na ao ponto de abusar dela. Todavia, não deixa de ser vergonhoso ver alguns estudantes universitários reduzirem-se a uma papa amorfa que pulula de festa em festa, ignorando à grande aquilo que deviam estar efectivamente a fazer: estudar.
 
Quando trabalhava na livraria da faculdade, apareceram-me à frente, num certo dia, um par de idiotas, daqueles que se acham com uma piada que vai daqui à galáxia seguinte. Diziam estar a fazer um inquérito: deveria um deles ir ou não à aula seguinte. A minha colega respondeu que deviam, o meu chefe também. Quando chegou a minha vez de falar, perguntei:
 
- Trabalhas?
- Não.
- Quem te paga o curso?
- Os meus pais.
- Então por que razão não lhes ligas para saberes o que acham da tua peregrina ideia de andares a querer faltar àquilo que eles andam a pagar?!...
 
Um dos rapazes olhou para o amigo com o qual eu falara e disse-lhe:
 
- Iiiiiiiii... Se calhar é melhor ires à aula.
 
Não sei se foram ou não. Por mim até podiam ter colocado uma corda com uma pedra ao pescoço antes de se atirarem a um rio que ia dar no mesmo. O que me ficou desta história é que realmente abundam hoje no ensino superior seres que não sabem o que aquilo é e que achincalham instituições e docentes que mereciam todo o respeito, como também já deviam ter merecido as escolas e docentes das escolas por onde passaram antes. Também faltei a aulas, também e diverti muito, mas nunca tive esse comportamento obtuso que agora traz estas notícias para a capa do jornal.
 
Felizmente e como em tudo há excepções, chegando também às universidades alunos e alunas dedicados e interessados, que sabem divertir-se sem prejudicar o bom ambiente das aulas e que sabem que existe tempo para tudo. Esses também mereciam ser referidos e destacados, porque não são só os maus desempenhos que merecem ser discutidos. É bom ver que muitos sentem ao chegar hoje à universidade, numa época tão complicada, o mesmo ou até mais do que aquilo que eu senti há exactamente dez anos atrás, quando fui colocada na faculdade e no curso que escolhera. Nada está, afinal, perdido enquanto esses alunos existirem.

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