quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

O segundo tablet

Li há pouco numa das revistas atrasadas que ando a ler (é a minha crónica mania de nunca ler revistas e jornais quendo ainda estão em dia) um excerto de uma reportagem sobre as crianças e os tablets. Senti-me agoniada quando foi referido o caso de uma criança com mais ou menos oito anos que referia ter já recebido o seu segundo aparelho deste tipo. E por que motivo uma criança tão pequena já vai no seu segundo tablet, perguntam vocês e muito bem. Porque atirou o primeiro ao chão e saltou em cima do ecrã num ataque de frustração causado pelo facto de o irmão ter pegado no gadget e o ter levado para o quarto dele contra a vontade do pequeno dono. Posto isto, aquilo que retive foi:´
 
- Um miúdo de oito anos com um aparelho caro e de que não precisa para nada;
- Um miúdo de oito anos incapaz de lidar com a frustração;
- Um miúdo de oito anos frustrado atira o tablet ao chão e SALTA em cima do ecrã como nos desenhos animados;
- Um miúdo de oito anos que deliberadamente parte o seu tablet recebe outro;
- Um miúdo de oito anos que não aprendeu que para cada acto há uma consequência: partir propositadamente o tablet só porque o irmão lho tirou não devia dar direito a receber um novo;
- Um miúdo de oito anos fica a achar que a vida funciona pelo sistema do «rei morto, rei posto».
 
Juro que não entendo o que passa pela cabeça destes pais que entram nestas farras. Não entendo esta educação que ensina aos meninos que se tiverem um ataque de nervos e partirem tudo, não faz mal: repõem-se os objectos partidos e pronto. Em meu entender, uma situação destas dava direito a que este menino não recebesse nada do género nos próximos muitos anos, nem que prometesse ser o próximo Anjo Gabriel. Aliás, comigo nem o primeiro tablet recebia, quanto mais o segundo...
 
Além disto, preocupa-me a incapacidade que muitos miúdos vão mostrando ter para lidar com a frustração. Alguém lhes tira o brinquedo e pimba: vai de partir e agredir. Vejo isto com muita frequência e assusta-me, até porque acho que a educação que está a ser dada a muitas crianças só fomenta este comportamento. Quando eu tinha um brinquedo novo, sabia que se o partisse o problema era meu e que não veria outro para substitui-lo. Também sabia que partisse alguma coisa a meio de um ataque de nervos, não só ficaria sem um brinquedo como, provavelmente, sairia de rabo aquecido da situação ou, pelo menos, com um bom par de berros nos ouvidos. Abençoada mãe que tive! Com o que por agora vou vendo, com os parvos sistemas de recompensas e de «ai saltaste em cima dele e fizeste esse objecto em cacos, mas não faz mal: a mãe dá-te outro», só posso agradecer aos céus a educação que tive. Mais dura, talvez, mas mais realista e próxima da vida que vou encontrando. Hoje, quando parto alguma coisa, propositadamente ou não, o prejuízo sai-me do bolso e ninguém me passa a mão pelo pêlo para repor a situação. E ainda bem. Mas quando estas crianças eternamente recompensadas chegarem à idade adulta e nada for como na infância, como será? Tenho medo.

2 comentários:

  1. Concordo tanto com este texto. Já assisti a cenas que me deixaram de queixo caído. Eu sei que não sou mãe e que ah e tal não sabemos nada da vida, mas custa-me que se esteja a criar uma geração que não sabe lidar com um não. A minha mãe deu-me muitas coisas, verdade, mas acho que se algum dia saltasse para cima de um brinquedo e desatasse a partir tudo não ia ter logo substituto... acho que se chama bom senso, o que não abunda nestes dias. Beijinhos*

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    1. E além disso, ainda me custam a engolir os presentes tão caros e despropositados para crianças tão pequenas. É como dizes: bom senso. Tem de haver muito bom senso para que não tratemos as crianças como pequenos adultos, acreditando que se não tiverem as últimas modas (independentemente dos preços) serão menos do que os outros. Isto faz-me mesmo muita confusão.

      Obrigada pelo comentário. :) Beijinhos.

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